sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

Sobre o filme «Violeta» de Kantemir Balagov, 2019





















Um filme sobre a dor, a morte e o amor, quando a guerra termina e pouco resta em torno de uma Leninegrado abalroada pelo vazio da sobrevivência. Ao hospital afluem doentes e mutilados. Os médicos e enfermeiros também o são. Duas mulheres procuram uma solução no meio dos escombros: Iya (Viktoria Miroshnichenko) e Masha (Vasilisa Perelygina). Entre elas uma criança pequenina. Ou a sua ausência. O jovem realizador Kantemir Balagov deixa o som cravar-se no ecrã e move-se como se não estivesse a utilizar uma câmara de filmar. Coloca-a junto aos actores, olhando-os, e veste-os, a eles e ao cenário, de verde e vermelho saturados. Uma complexidade cénica que surge como abstracta, estética, adensando a aceleração triste das personagens. Pelo meio da tristeza, a cidade condensa-se como o vapor de água numa superfície fria. A eutanásia é pedida encarecidamente por quem classifica tudo o que o rodeia como “um lamento pela guerra”. Uma responsável pela saúde soviética hospitalar distribui presentes aos estropiados e recebe uma salva de palmas confrangedora. Até Masha resolve casar, mas quando é apresentada aos futuros sogros as convenções não conseguem ajustar-se ao seu desejo de fuga, à sua tenaz capacidade de não olhar para trás e de ver o que ficou irremediavelmente destruído. Marsha volta e encontra Iya de mala aberta, resolvida a seguir viagem.
A luz impressionista sobre a realidade mais cruel lembra o mestre do realizador, Alexandr Sokurov, de «Mãe e Filho» (1997), ou o arrepiante belicismo de «Vem e Vê» (Elem Klimov, 1985), ou a interioridade desalentada e opressiva de «Dovlatov» (Aleksey German Jr., 2018).

«Violeta» e Kantemir Balagov – um filme e um realizador a relembrar.

jef, dezembro 2019

«Violeta» (Dylda) de Kantemir Balagov. Com Viktoria Miroshnichenko, Vasilisa Perelygina, Konstantin Balakirev, Andrey Bykov, Kseniya Kutepova, Igor Shirokov. Argumento: Kantemir Balagov, Aleksandr Terekhov Fotografia: Kseniya Sereda. Rússia, 2019, Cores, 130 min.

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