Longe de «Eraserhead» (1977) ou «Inland Empire» (2006), talvez um dos filmes de
David Lynch onde o realizador se espraia sem pudor em todas as suas maiores
dimensões: o humor, a fantasia, a moralidade, o erotismo, a exuberância dos decores e da música. As histórias cruzadas com um nexo desconexo. Assumindo a maior
das suas dimensões – a comédia –, usa e abusa desse extravagante e delicioso modo de oferecer aos actores a liberdade de lançarem
as personagens sobre a narrativa. Uma espécie de bailado burlesco. As
personagens são a própria história como se se tratasse de um livro de contos fictícios, dilacerantes
e muito divertidos. Um filme da Disney para crianças que não têm medo do
escuro, do sangue, do perigo das estradas americanas ou do sexo. Com bruxas más
e fadas madrinhas! Aqui nada falta!
História de amor
indestrutível que todos desejam destruir (mas jamais conseguirão). A começar
pela mãe-madrasta de Lula (Laura Dern), a extraordinária Marietta Fortune (Diane
Ladd), que, desejando sexualmente o genro Sailor (Nicolas Cage), pretende a todo
o custo matá-lo pois este terá assistido à morte (muito pouco acidental) do
marido e pai de Lula, num incêndio provocado. Sailor, exibindo o seu casaco
pele de cobra, símbolo da sua individualidade, por duas vezes é esperado à
porta da prisão pela sua amada. Na última, cantar-lhe-á «Love Me Tender»,
conforme prometido. Até lá, os amantes inseparáveis serão confrontados com Bobby
Peru (Willem Dafoe), Santos (J.E. Freeman), Johnnie Farragut (Harry Dean
Stanton), Juana (Grace Zabriskie), Uncle Pooch (Marvin Kaplan) ou Perdita (Isabella
Rossellini).
Um pouco de Fellini pela
humanidade na extravagância. Um pouco de Coppola pelo colorido desabrido da
imaginação. Um pouco de Tarantino pelo modo de construir uma peça única a
partir do fundo de catálogo das colecções de revistas de aventuras pulp fiction.
jef, fevereiro 2022
«Coração Selvagem» (Wild
at Heart) de David Lynch. Com Nicolas Cage, Laura Dern, Willem
Dafoe, J.E. Freeman, Crispin Glover, Diane Ladd, Calvin Lockhart, Isabella
Rossellini, Harry Dean Stanton, Grace Zabriskie, Sherilyn Fenn, Marvin Kaplan, William
Morgan Sheppard, David Patrick Kelly, Freddie Jones, John Lurie, Jack Nance, Pruitt
Taylor Vince. Argumento: David Lynch baseado no romance de Barry Gifford.
Produção: Steve Golin. Fotografia: Frederick Elmes. Música: Angelo
Badalamenti. EUA, 1990, Cores, 125 min.
Um belo passeio verbal por este maravilhoso filme.
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