Todo o filme se concentra
no sorriso de Ada (Milana Aguzarova). Está ali a história inteira. A câmara
filma muito próximo daquele rosto generoso onde o medo, o complexo e a entrega emocional
se combinam sem deixar que o espectador se aperceba da paragem de autocarro
onde ela espera alguém. O sorriso é transparente mas sempre velado. Ela
esconde-o ou esconde-se atrás dele. Ada está rodeada pelo opressivo carinho, pela
exigência afectiva ou mesmo por uma abusiva prisão domiciliária. Todos a
vigiam. Em torno dela e do seu passado inundado de violência e de guerra, protegendo-a
e oprimindo-a, circula o seu pai (Alik Karaev), os irmãos Akim (Soslan Khugaev)
e Dakko (Khetag Bibilov) e até o proto-namorado Tamik (Arsen Khetagurov). Tudo
em circuito fechado, numa pequena povoação da Ossétia do Norte, presa à tal câmara
de filmar que não deixa respirar. Talvez demasiado atarefada, a câmara, em
focar obsessivamente, repetidamente, pormenores estéticos, pequenos actos ou
movimentos circulares: os carros, os ajuntamentos, as buscas, as fugas.
Movimentos que precisariam de um maior campo de visão, talvez de uma mais ampla
linha narrativa, maior diversificação estética, talvez menos sequências
explicativas.
Contudo, o sorriso
sofrido (e talvez libertado ou libertador) de Ada não deixará de nos acompanhar.
jef, fevereiro 2022
«Descerrando os Punhos» (Unclenching
the Fists) de Kira Kovalenko. Com Milana Aguzarova, Alik Karae,
Soslan Khugaev, Khetag Bibilov, Arsen Khetagurov, Milana
Pagieva. Argumento: Kira Kovalenko, Lyubov Mulmenko, Anton Yarush. Produção:
Sergey
Melkumov, Alexander Rodnyansky. Fotografia: Pavel Fomintsev. Rússia, 2021, Cores,
97 min.
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