Para que não fiquem dúvidas, o editorial do #5 é muito pragmático:
«Nós, que somos politicamente concretos, na época do degelo,
calçámos os pneus de chuva, tirámos a carta de condução para veículos
anfíbios, vendámos os olhos para ver melhor o lado de dentro, e zarpámos por aí
a fora, numa caravana dismórfica, feita de quem se queira juntar.
E, a partir de então, os verdadeiros e inconformados
contestatários serão aqueles que, por teimosia ou hábito, insistem em circular
sempre na mesma direção. Todo este processo, claro, provoca acidentes e vítimas
morais. Se a regra é subverter as regras, todos têm eventualmente razão.
Resta-nos escrever uma declaração amigável em versos alexandrinos (também pode
ser uma declaração de amor!) e depois queimá-la como faziam os profetas da arte
efémera.
Se formos muitos a acelerar em contramão, acabaremos por
mudar o sentido do mundo.»
José Eduardo Agualusa é o nosso querido (e viajado continental) artista consagrado que nos entrega a história «A Ilha Submersa». Abílio de seu nome.
Pires Laranjeira enquadra a obra do autor de forma simples e completa. Com ele, compreendemos o país e a escrita de um dos autores mais importantes da língua portuguesa.
Dorit Zilberman relata uma viagem entre quatro
paredes israelitas pois a pandemia resguardou, subtraindo, o mundo a essas duas
almas que envelhecem amando.
Paulo Kellerman Faz-nos caminhar apena numa direcção mas que, por sinal e por fim, se contradiz nos opostos dos seus dois
sentidos.
O poeta-músico, Luca Argel, serve-nos, entre os seus poemas, o poeta com batatas e molho de alcaparras. O Brasil fica órfão quando perde para sempre o número do telefone fixo.
Filomena Marona Beja escreve um conto através da sua escrita arquitectonicamente sintética sobre um caso de discriminação e perseguição social. Algures em Portugal.
Ricardo Tiago Moura fala-nos poeticamente da contagem brutal do tempo que, no fundo, se
restringe e contrai sobre a derradeira hora onde se encontram todos os logros.
Gaëlle Istanbul escreve sobre a finalidade cabal (talvez
vã) do nascimento e do seu caminho retrógrado através das sombras do presente, até uma outra dimensão.
Amosse Mucavele reinventa o velho embuste
matrimonial e a origem de uma certa mentira fronteiriça, também a dor dos cinéfilos.
Paola D’Agostino faz renascer a esperança na idade que
conta. A Rita e a Senhora Dona Isabel, sua tia-avó, que se cansa de andar
sempre bem-disposta.
Carolina Furtado
Freitas conta a
história de um livro escondido e de uma alma perseguida. As aves, guardado
muito junto ao peito.
Cláudia Clemente conta a historia de um 5º Esquerdo e
de quem lhe mora ao lado, incessante, inconstante, inconsequente. Revoltada.
João Vieira, entre didascália, relata a história
de ELE ou ELA POR ELE em que de batom em riste ouve Marlene Dietrich: “Para
onde vão todas as flores?”.
Vítor Encarnação descreve-nos as diversas dimensões de
uma árvore: a memória, o trauma, o sonho, a quimera, a afronta, o medo…
Joel Neto redige um libelo pelos Açores, contra o isolamento, contra o nepotismo, contra o essa visão plastificada do luso paraíso. Um apelo talvez polémico, certamente urgente.
Inez Caria enche plasticamente o #5 da revista,
do fanzine, do jornal, do pasquim, da revista com os seus desenhos recortados
na abstracção figurativa que tem tanto de líquido quanto de hipnótico.
Por fim, em contramão, os artistas mais que moribundos,
reunidos: Fernanda Cunha, Manuel Halpern, Paulo Romão Brás, também este que assina João Eduardo Ferreira, compõem o modo gráfico e reescrevem sobre a tragicomédia
que é a via pública traçada por autoestradas e passadeiras de peões, pela travessia, pelo
susto, pela contramão em movimento uniformemente acelerado.
E assim, de novo em Outubro,
o mês do suave Outono luminoso, «A Morte do Artista» #5 será apresentada na Biblioteca do Palácio Galveias, em
Lisboa, no dia 22, pelas 16h00. Haverá drama, convívio, conversa, refrescos e biscoitos.
Apareçam!
jef, outubro 2022
Sem comentários:
Enviar um comentário