quinta-feira, 18 de maio de 2023

Sobre o livro «O Homem Ilustrado» de Ray Bradbury. Cavalo de Ferro, 2022 (1951). Tradução de Paulo Tavares.










Ray Bradbury não é propriamente um cronista do futuro. Ele move-se no seu-nosso presente-passado com a alegria e a consciência de quem intui que a imaginação, o humor, a tolerância, a melancolia, o medo ou o sarcasmo são as fórmulas da humanidade onde se deve apoiar para poder escrever, escrever, escrever e não morrer. Tal como o empregado de mesa parisiense Laurent lhe explicou que dançava, dançava, dançava pela noite fora e não morria. A explicação é dada por Ray Bradbury no início destes contos maravilhosos.

Há uma sensação de humana vitalidade nas narrativas, uma quase declaração apologética sobre a política, a sociedade, a tecnologia, a família ou o amor. É aqui que talvez se afaste da imaginação frenética de Júlio Verne ou Edgar Allan Poe. A sua, talvez ainda mais frenética e delirante, derive de uma generosa capacidade de olhar o interior de cada uma das pessoas (à John Streinbeck). Nesse exercício, o mundo cenográfico de feiras de aberrações, circos, galáxias, sistemas planetários, foguetões, comandos à distância e inteligência artificial transforma a fantasia num certo romantismo quase “neo-realista” ou "para-realista".

Como resumo ou epígrafe, existe no livro uma frase que, ao referir-se à relação dos adultos com o mundo infantil, poderá também definir a vocação literária de Ray Bradbury.

«A civilização adulta passava e voltava a passar pelas crianças atarefadas, invejosa daquela energia furiosa e selvagem, tolerantemente divertida com a sua desenvoltura, desejosa de se juntar a elas.»

(só que o conto não acaba lá muito bem…)

 

jef, abril 2023

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