«Gosto tudo de ti»,
ressoa pelo filme nas
palavras eternamente repetidas por António a Maria José, num jogo de planos,
redes, perspectivas, dúvidas, inseguranças. Paixão.
As palavras, as mais
belas palavras, são do escritor António Lobo Antunes a sua mulher e sua filha,
vindas de Angola em guerra, no início dos anos 70. Escritas, lidas e publicadas.
É a realidade das palavras que é exposta. Puras e simples como a verdade do
tormento da guerra colonial e da paixão assolapada.
Mas a voz ouvida não é
de quem as escreve, António (Miguel Nunes), mas de quem as lê, Maria José
(Margarida Vila-Nova). Uma voz feminina que se exprime por cima da guerra de
homens, ensanguentada e suada. Por vezes uma voz confundida pelos extraordinários trechos musicais de Luís de Freitas Branco, Fernando
Lopes-Graça ou Ligeti. Por vezes, assustada pela imagem maravilhosamente
captada por João Ribeiro. Por vezes, toldada pelo olhar esplêndido de Miguel
Nunes.
Em que plano, rede,
perspectiva, então me devo situar?
As palavras que são
únicas; o olhar claro como água; as nuvens, a água e os elefantes, que a
fotografia a preto e branco exalta; a belíssima música que interpreta a guerra; podem não atingir um foco único…
Ou estarei a sentir mal
um excelente filme?
Ou, na verdade, o tempo
de África não coincide com a Guerra, em tempo?
jef, setembro 2016
«Cartas da Guerra» de
Ivo M. Ferreira. Com Miguel Nunes, Margarida Vila-Nova, Ricardo Pereira, João
Pedro Vaz, Isac Graça, Francisco Hestnes Ferreira, Cândido Ferreira, Maria João
Abreu. Portugal, 2016, Cores, 105 min.
Sem comentários:
Enviar um comentário