quarta-feira, 1 de agosto de 2018

Sobre o filme «Olhos sem Rosto» de George Franju, 1960



















O cinema é memória. E é na memória do espectador que funciona. Por que será que «Olhos sem Rosto» de George Franje, realizado em 1960, ainda provoca ansiedade, medo, uma espécie de atracção maravilhosa pelo que não existe mas nos parece real e aterrador? Talvez porque usa o sublime para nos fazer querer que esse é o nosso mundo, apesar de inteligível.

E se o cinema é memória, «Olhos sem Rostos» leva-me à pureza estética de «Nosferatu» de F.W. Murnau  (1922), de «A Bela e o Monstro» e «O Testamento de Orfeu» de Jean Cocteau (1946, 1960), de «Psico» de Alfred Hitchcock (1960), … até de «Eduardo Mãos de Tesoura» de Tim Burton (1990). E, claro, da série televisiva que mais medo me meteu em miúdo: «Les Compagnons de Baal» de Pierre Prévert (1968).

«Olhos sem Rosto» faz-nos acreditar no que é pura invenção, faz-nos apavorar do que é irreal, faz-nos crer que a estrutura do mundo é alguma coisa entre o construído e o imaginado. Aí, no meio, nós existimos. A música de Maurice Jarre assim nos condiciona, assim a fotografia linear quase geométrica (Eugen Schüfftan) que ilumina automóveis, criptas, sótão e caves, transforma-nos o coração. E esse, o coração, é bem real e faz-nos ter medo da realidade. Porque, ali, a realidade é o cinema de George Franju.

Claro que o amor incondicional entre o Dr. Génessier (Pierre Brasseur), a sua filha Christiane (Édith Scob) e Louise (a maravilhosa e aristocrática Alida Valli), o amor que à morte levou e a esta levará, é o fulcro da crença inculcada no espectador. O amor, subtil, grácil, profundo mas verdadeiro, pode matar, mas também libertar.

Um filme inesquecível. Que a memória o guarde.

jef, julho 2018

«Olhos sem Rosto» (Les Yeux sans Visage) de George Franju. Com Pierre Brasseur, Edith Scob, Alida Valli, Juliette Mayniel, Alexandre Rignault, Béatrice Altariba, Charles Blavette, Claude Brasseur, Michel Etcheverry, Yvette Etiévant, René Génin, Lucien Hubert. Argumento: Pierre Boileau, Thomas Narcejac, Jean redon, Claude Sautet, baseado no romance de Jean Redon. Fotografia: Eugen Schüfftan. Música: Maurice Jarre. França / Itália, 1960, P/B, 90 min.

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