Anton Tchekov.
«A Gaivota» de Anton Tchekov parece ser à prova de bala.
É uma peça única no centro da arte de Tchekov. Um autor único
que transborda de afecto e rigor sobre quem envelhece, quem por tão jovem
deseja ser mais velho, quem inveja, que sofre de ciúmes, quem ama sem ser amado,
quem entristece, quem profundamente ama e a todo o custo mantém esse laço genético à família,
à terra-mãe, ao mundo rural que quase desdenha da urbe, à esperança de um dia
seguinte… Ou talvez nem tanto.
Relembro o cuidado quase ecológico, impressionista e
terno, com que Nikita Mikhalkov traduz para o cinema «Platonov» em «Peça Inacabada
para Piano Mecânico» (1977).
Por isso, fico desiludido. Não há razão para o realizador Michael
Mayer (o guião apressado é de Stephen Karam) multiplicar as cenas curtas em carrocel, as sucessivas subidas e descidas de escadas, as fugas através da janela em
direcção ao lago, as presunçosas e histéricas aproximações sobre os actores que
apenas querem representar e não exibir trejeitos, jóias ou guarda-roupa.
Tchevok é o dramaturgo do tempo que passa. Lentamente.
Actores como Annette Bening (Irina Arkadina), Brian Dennehy
(Sorin), Saoirse Ronan (Nina) Mare Winningham (Polina) não precisariam de artefactos
de cena para tão bem representar. (Tanto que gostaria de ver Woody Allen com
estes actores e com esta peça de teatro maravilhosa).
Contudo a câmara pára reverente sobre a negra sombra de Masha
para que tomemos o peso do seu maior sofrimento. Elisabeth Moss é fantástica no acto maior de resignação. A única personagem paradigmática a assumir de corpo e alma a pura resignação face a uma escolha menor.
Contudo, «A Gaivota» de Anton Tchekov é mesmo à prova de bala. Vale o tempo de ir ao cinema e rever esse Tempo que vai
passando… segundo Tchekov.
jef, julho 2018
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