É
um filme que exacerba a componente estética, tanto no que respeita à imagem (Michal
Dymek) como à manipulação sonora (Radoslaw Ochnio), um facto que se sobrepõe à
música original (Pawel Mykietyn) – ouvem-se as patinhas das formigas e os
morcegos batem as asas como pombos.
No
final, o realizador polaco tranquiliza-nos dizendo que os animais não foram
maltratados e que o filme é feito sob a égide do seu amor pelos animais. Nem os
seis lindos burrinhos que fazem de EO, nem os dromedários, o camelo do circo. Nem
os cavalos traficados para carne. (Ai «Os Inadaptados» de John Huston, 1961!) Nem
o lobo atingido pela calada da noite, nem os canídeos abatidos ilegalmente para
extracção das peles. (Confesso que sobre este aspecto já vinha traumatizado de
«Os Espíritos de Inisherin» – Martin McDonagh, 2022).
Por
outro lado, diz ainda o realizador, que se baseou num filme do mago Robert
Bresson, o realizador de Deus e da culpa, do herói e da redenção – «Peregrinação
Exemplar» (Au Hasard Balthazar), 1966. Não conheço.
«EO»
divide-se por episódios sequenciais e aventurosos, uns dramáticos outros de
leve toada humorística, seguindo a dita e a desdita do burrinho EO no encontro
com bons e maus humanos. A câmara e a captação do som sugerem ser o que os
olhos negros captam, ou como as longas orelhas felpudas do animal apreendem a
realidade. Sugerem ainda que o amor da jovem circense Kasandra por EO é que que
fica na memória deste e, por vezes, o faz ultrapassar as baias que o prendem. Surgem
episódios como fractais absctractos, surrealistas ou fantasiosos. Ternos ou
assustadores. Falando das diversas formas de uso e maus tratos aos animais. Até
o asinino chegar ao palacete italiano da condessa (Isabelle Huppert) onde a
história centra-se na relação desta com o seu filho ou enteado, religioso e
fugitivo.
Chegando
aí, quase no fim deste curto filme, apeteceu-me rever «O Fantasma da Liberdade»
(Luis Buñuel, 1974), também com muitos bichos e muitos padres.
Quando
cheguei a casa fui buscar o livro «Platero e Eu» de Juan Ramón Jiménez!
Interessante, sim… Angustiante, certamente… Pretensioso, talvez... Seria necessário tanto barulho, tantas imagens, tantas histórias?
Sobre o ciclo natural dos animais e dos homens recordo um filme único: «As Quatro Voltas» de Michelangelo Frammartino (2010).
jef,
março 2023
«EO»
de
Jerzy Skolimowski. Com Sandra Drzymalska, Lorenzo Zurzolo, Mateusz
Kosciukiewicz, Isabelle Huppert, Tomasz Organek, Lolita Chammah, Anna Rokita, Michal
Przybyslawski. Argumento e Produção: Ewa Piaskowska, Jerzy Skolimowski. Fotografia:
Michal Dymek. Música: Pawel Mykietyn. Som: Radoslaw Ochnio. Polónia, Itália, 2022,
Cores, 88 min.
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