Este será o romance que todos os silvicultores, trabalhadores
da floresta e amantes da natureza deviam ser obrigados a ler.
Uma enorme fábula que termina com a imagem de algum viajante
sobre o mar de névoa. Para o ilustrar, Caspar David Friedrich teria de o
retratar de costas como uma criança de doze anos que, finda a infância, acaba
naquele instante de poder escutar as vozes do vento Matteo, das corujas e do
génio da árvore, Bernardi, para se ficar apenas pela voz do seu próprio silêncio.
Romantismo puro.
Ora, após a morte do tio-avô Antonio Morro, a criança
ligeiramente esquálida e aparentemente sem cariz, Benvenuto Procolo passa a estar
sob custódia de um outro tio, o sisudo e odiado coronel Sebastiano Procolo. Uma
figura que parece saída das sinistras fábulas dos irmãos Grimm. Enquanto o
pequeno Benvenuto recebe por herança a maior parte produtiva da propriedade
florestal, o invejoso tio Sebastiano apenas fica com um pequeno bosque de estrutura ajardinada, relíquia da floresta primordial, onde não é possível
tocar por motivos obscuros e ancestrais. Nada aqui revelo que não esteja
contido nos primeiros parágrafos do livro, bem entendido.
Contudo, o silvicultor agrimensor e organizador de rechegas
florestais tem de ter em conta que a estrutura dendrológica tem a sua própria
cadência, o seu próprio tempo, a sua própria linguagem. Nesse campo, o
profissional tem de ter muito em conta a voz das gralhas e outros pássaros, das
raposas e roedores, dos ventos. Deve ter tempo para ouvir o “Boletim de
Notícias”, não ser sobranceiro ao equilíbrio ecológico e nunca desprezar a
possibilidade das pragas entomológicas que, agora e ali, podem não possuir o contraditório
dos seus predadores naturais.
E se um rato coxo se entretiver a roer a trave superior da
cama para que lhe caia em cima e o mate, não se chateie, a Natureza sabe sempre
o que faz.
Uma fábula, séria e risível em simultâneo, escrita em 40 pequenos
contos encadeados sobre a imperiosa alma da natureza florestal, que tanto pode invocar o romantismo de Caspar David Friedrich como aquele outro, helénico e
temporão, o das odes à mãe-natureza de Friedrich Hölderlin.
Um livro infantil, divertido, essencial.
jef, abril 2024
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