segunda-feira, 8 de abril de 2024

Sobre o livro «O Segredo do Bosque Velho» de Dino Buzzati, Cavalo de Ferro, 2018 (1935). Tradução de Margarida Periquito.



 







Este será o romance que todos os silvicultores, trabalhadores da floresta e amantes da natureza deviam ser obrigados a ler.

Uma enorme fábula que termina com a imagem de algum viajante sobre o mar de névoa. Para o ilustrar, Caspar David Friedrich teria de o retratar de costas como uma criança de doze anos que, finda a infância, acaba naquele instante de poder escutar as vozes do vento Matteo, das corujas e do génio da árvore, Bernardi, para se ficar apenas pela voz do seu próprio silêncio. Romantismo puro.

Ora, após a morte do tio-avô Antonio Morro, a criança ligeiramente esquálida e aparentemente sem cariz, Benvenuto Procolo passa a estar sob custódia de um outro tio, o sisudo e odiado coronel Sebastiano Procolo. Uma figura que parece saída das sinistras fábulas dos irmãos Grimm. Enquanto o pequeno Benvenuto recebe por herança a maior parte produtiva da propriedade florestal, o invejoso tio Sebastiano apenas fica com um pequeno bosque de estrutura ajardinada, relíquia da floresta primordial, onde não é possível tocar por motivos obscuros e ancestrais. Nada aqui revelo que não esteja contido nos primeiros parágrafos do livro, bem entendido.

Contudo, o silvicultor agrimensor e organizador de rechegas florestais tem de ter em conta que a estrutura dendrológica tem a sua própria cadência, o seu próprio tempo, a sua própria linguagem. Nesse campo, o profissional tem de ter muito em conta a voz das gralhas e outros pássaros, das raposas e roedores, dos ventos. Deve ter tempo para ouvir o “Boletim de Notícias”, não ser sobranceiro ao equilíbrio ecológico e nunca desprezar a possibilidade das pragas entomológicas que, agora e ali, podem não possuir o contraditório dos seus predadores naturais.

E se um rato coxo se entretiver a roer a trave superior da cama para que lhe caia em cima e o mate, não se chateie, a Natureza sabe sempre o que faz.

Uma fábula, séria e risível em simultâneo, escrita em 40 pequenos contos encadeados sobre a imperiosa alma da natureza florestal, que tanto pode invocar o romantismo de Caspar David Friedrich como aquele outro, helénico e temporão, o das odes à mãe-natureza de Friedrich Hölderlin.

Um livro infantil, divertido, essencial.


jef, abril 2024

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