quinta-feira, 13 de fevereiro de 2025

Sobre o filme «Imagem de Uma Mãe» de Hiroshi Shimizu, 1959



 


















Quase no final do filme, existe uma longa pausa, um plano longo sobre uma torneira que, como metrónomo, faz cair sistematicamente o pingo de água sobre um lava-loiças. Esta pausa, suspensão, serve de consciência e recuperação emocionais ao espectador após a leitura da redacção que Michio (Michihiro Mori) escreveu na escola sobre os acontecimentos que até ali nos foram relatados. O espectador chora, como toda a família chora, enquanto a leitura é feita em voz alta.

É surpreendente como a história nos é oferecida sem um pingo de maldade, de um modo tão clássico, tão dramático como se tudo ocorresse em cima de um palco. Planos sempre repetidos sobre rotinas diárias. Casas humildes de uma família remediada num bairro quase pobre. O pós-guerra subentendido e a sobrevivência familiar a ser testada sobre tradições ancestrais.

Também em «Primavera Tardia» (Yasujiro Ozu, 1949), existe uma cena final de uma maçã a ser descascada, suspendendo a acção sobre a comoção. Também em «O Som do Nevoeiro» (Hiroshi Shimizu, 1956) existe esse tempo desencontrado, feito de emoção, espera e luto por cumprir.

Como em «Aniki Bóbó» (Manoel de Oliveira, 1942), a narrativa neorrealista é colocada, absoluta, nas mãos das crianças. Ao contrário de «Bom Dia» (Yasujiro Ozu, 1959), onde a infância é tida por radiosa, colorida, símbolo de revolta benévola e acção do futuro contra a tradição.

Não existe melhor forma de compreender a ondulação emocional que integra a perda de alguém e o luto efectivo. O pombo que voa, aparecendo e reaparecendo vindo dos céus, a fotografia de uma mãe que aparece e reaparece da gaveta ou de dentro do caderno escolar. O tempo que espera, a paciência oferecida, a bondade exigida, o perdão necessário. O carinho como solução.

Uma absoluta obra-prima Se o espectador sair do filme de olhos enxutos, deve verificar se o seu coração não terá sido trocado por uma rocha eruptiva.  


jef, janeiro 2025

«Imagem de Uma Mãe» (Haha no omokage) de Hiroshi Shimizu. Com Jun Negami, Michihiro Mori, Chikage Awashima, Sachiyo Yasumoto, Bontaro Miake, Chieko Murata, Satoko Minami, Tamae Kiyokawa, Nobuo Minamitaka, Tatsuo Hanabu, Yosuke Irie, Tsutomu Nakata, Kan Takami, Kenji Oyama. Produção: Fujio Nakashiro, Kazuyoshi Takeda. Fotografia: Hiroshi Ishida. Música: Yuji Koseki. Guarda-roupa: Julie Harris. Cenografia: Sidney Cain e Robert Laing. Japão, 1959, P/B, 89 min.

 

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