sábado, 15 de fevereiro de 2025

Sobre a peça «Construção» sobre Três Dramas Históricos de Gertrude Stein. Teatro do Bairro, 2025

























Diz a folha de sala que “Três Dramas Históricos” é uma trilogia escrita por Gertrude Stein em 1930. Pois podemos acrescentar que «Construção» exibe uma liberdade literária e minúcia dramática que faz inveja a muita escrita contemporânea toldada pelos tempos sombrios que andamos a viver. Relembremos que «Ulisses» de James Joyce foi escrito entre 1914 e 1921. «O Som e a Fúria» de William Faulkner foi publicado em 1929. «Orlando»  de Virginia Woolf, em 1928. «Bolero» de Ravel, ouvido em público pela primeira vez em 1928. A liberdade artística e a renovação semântica eram revolucionários. Era necessário encontrar novos caminhos narrativos mesmo que estes fossem aparentemente incompreensíveis ou provocassem a relutância de editores e encenadores.

Três Dramas Históricos de Gertrude Stein sustenta o princípio de surpresa e renovação dramática. Digamos, uma saudável renovação provocatória.

«Construção» é uma peça modernista e expressionista. Como um espectáculo musical (Paulo Abelho e João Eleutério), uma paródia séria próxima da dança moderna (Paula Careto) onde a encenação (António Pires) e a marcação de cena ou os figurinos (Luísa Pacheco) dos seis palhaços ou mimos nos transportam para uma certa inocência infantil, até divagação onírica. A estrutura negra do cenário fazendo desaparecer sincopadamente as figuras coloridas em “stop motion” ou os vidros espelhados que rodam, multiplicando as personagens, fazem-nos crer estar perante um certo circo ou carrossel. “Será que eles estão a entender?”, perguntam os actores olhando os espectadores nos olhos. Será que o edifício está a ser construído naquela esquina? Haverá alguma árvore perto ou longe do campo? Será que um leão nos confronta com o perigo ou apenas o sugere, já que estamos num teatro?”. Será que existe mesmo uma infiltração a partir do telhado? Pling. Plong.

Esta peça só será entendida pela abstracção do significado ou dos múltiplos significados de uma preposição, de uma palavra, de um sintagma.

Esta peça é uma festa para a nossa imaginação. Mergulhemos nela sem sequer tentarmos domesticá-la.


14 de fevereiro de 2025

«Construção» sobre Três Dramas Históricos de Gertrude Stein. Tradução e Adaptação: Luísa Costa Gomes. Encenação: António Pires. Com Cassiano Carneiro, Carolina Campanela, Carolina Serrão, Francisco Vistas, Jaime Baeta, Rita Durão. Cenografia: João Mendes Ribeiro. Figurinos: Luísa Pacheco. Desenho de Luz: Rui Seabra. Música: Paulo Abelho e João Eleutério. Movimento: Paula Careto. Caracterização: Ivan Coletti. Costureira: Rosário Balbi. Construção de cenário: Fábio Paulo. Operação de luz: António Serrão. Operação de som: Matheus de Alencar. Direcção de cena: Alexandre Jerónimo. Estagiárias de guarda-roupa: Sol Piloto e Larissa Angeli. Ilustração: Joana Villaverde. Fotografia de cena e trailer: Manuel Loureiro. Vídeo: Tiago Inuit. Bilheteira: Sofia Estriga. Direcção de produção: Federica Fiasca. Produtor: Alexandre Oliveira. Produção: Ar de Filmes / Teatro do Bairro. Duração: 100 minutos aproximadamente. Teatro do Bairro.

 

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