Diz
a folha de sala que “Três Dramas Históricos” é uma trilogia escrita
por Gertrude Stein em 1930. Pois podemos acrescentar que «Construção» exibe uma
liberdade literária e minúcia dramática que faz inveja a muita escrita contemporânea
toldada pelos tempos sombrios que andamos a viver. Relembremos que «Ulisses»
de James Joyce foi escrito entre 1914 e 1921. «O Som e a Fúria» de William
Faulkner foi publicado em 1929. «Orlando»
de Virginia Woolf, em 1928. «Bolero» de Ravel, ouvido em público pela
primeira vez em 1928. A liberdade artística e a renovação semântica eram revolucionários.
Era necessário encontrar novos caminhos narrativos mesmo que estes fossem aparentemente
incompreensíveis ou provocassem a relutância de editores e encenadores.
Três
Dramas Históricos de Gertrude Stein sustenta o princípio de surpresa e
renovação dramática. Digamos, uma saudável renovação provocatória.
«Construção» é uma peça modernista e expressionista. Como um espectáculo musical (Paulo Abelho e João Eleutério), uma paródia séria próxima da dança moderna (Paula Careto) onde a encenação (António Pires) e a marcação de cena ou os figurinos (Luísa Pacheco) dos seis palhaços ou mimos nos transportam para uma certa inocência infantil, até divagação onírica. A estrutura negra do cenário fazendo desaparecer sincopadamente as figuras coloridas em “stop motion” ou os vidros espelhados que rodam, multiplicando as personagens, fazem-nos crer estar perante um certo circo ou carrossel. “Será que eles estão a entender?”, perguntam os actores olhando os espectadores nos olhos. Será que o edifício está a ser construído naquela esquina? Haverá alguma árvore perto ou longe do campo? Será que um leão nos confronta com o perigo ou apenas o sugere, já que estamos num teatro?”. Será que existe mesmo uma infiltração a partir do telhado? Pling. Plong.
Esta
peça só será entendida pela abstracção do significado ou dos múltiplos significados
de uma preposição, de uma palavra, de um sintagma.
Esta
peça é uma festa para a nossa imaginação. Mergulhemos nela sem sequer tentarmos
domesticá-la.
14
de fevereiro de 2025
«Construção»
sobre Três Dramas Históricos de Gertrude Stein. Tradução e Adaptação: Luísa
Costa Gomes. Encenação: António Pires. Com Cassiano Carneiro, Carolina
Campanela, Carolina Serrão, Francisco Vistas, Jaime Baeta, Rita Durão. Cenografia:
João Mendes Ribeiro. Figurinos: Luísa Pacheco. Desenho de Luz: Rui Seabra.
Música: Paulo Abelho e João Eleutério. Movimento: Paula Careto. Caracterização:
Ivan Coletti. Costureira: Rosário Balbi. Construção de cenário: Fábio Paulo. Operação
de luz: António Serrão. Operação de som: Matheus de Alencar. Direcção de cena:
Alexandre Jerónimo. Estagiárias de guarda-roupa: Sol Piloto e Larissa Angeli.
Ilustração: Joana Villaverde. Fotografia de cena e trailer: Manuel Loureiro.
Vídeo: Tiago Inuit. Bilheteira: Sofia Estriga. Direcção de produção: Federica
Fiasca. Produtor: Alexandre Oliveira. Produção: Ar de Filmes / Teatro do
Bairro. Duração: 100 minutos aproximadamente. Teatro do Bairro.
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