Há
muitos modos de olhar os filmes de Jonás Trueba: comédia dramática ou
drama cómico; experiência cinéfila ou a importância do nada; a intelectualidade
literária ou simplesmente a câmara dirigida para o quotidiano.
Em «Voltareis», mais até do que em «Têm de Vir Vê-la» (2022), o espaço da casa onde, há 15 anos, vivem Ale (Itsaso Arana), realizadora, e Alex (Vito Sanz), actor, parece ser o fulcro deste drama com happy end, assim admitido desde o início do filme ou seja desde o seu título. Se no filme de 2022 uma casa devia ser visitada fora de portas madrilenas, aqui a casa bem no centro da capital faz a câmara circular atrás das duas personagens que resolvem separar-se durante uma noite de insónia sob a proximidade de uma tempestade de Verão. Uma belíssima cena.
Segundo uma velha teoria do pai de Ale (Fernando Trueba) serão as separações que devem ser comemoradas ao contrário das uniões. E por essa razão e com essa razão, Ale e Alex resolvem organizar uma festa com amigos e família para o dia 22 de setembro, ultimo dia de Verão.
Também
esta máxima, também esse dia são repetidos, minuto a minuto, ao mesmo tempo que
a festa vai sendo anunciada perante a incredulidade de todos. Também o movimento
de câmara dentro da casa é circular, sem fim, sobre a necessária rotina diária.
Também a montagem do filme que Ale está a terminar acompanha essa repetição,
como qualquer minuciosa montagem em cinema. E as cenas deste filme sobrepõem-se
às do que o espectador vê no momento.
Como
um jogo de espelhos, que se colocam frente a frente, as imagens repetem-se
infinitamente, sempre iguais mas ao mesmo tempo sempre diferentes. O dia-a-dia,
a repetição, a normalização de um caminho constante e comum é enaltecido pelo
texto de Kierkegaard, o eterno indeciso. Segundo este, o amor por repetição é
muito mais profícuo do que o amor apaixonado e finito inicial, ou o outro entediante
que tende para o fim.
Esta
comédia por repetição é sustentada pela descomunal cumplicidade dos actores principais,
Itsaso Arana e Vito Sanz, que igualmente assinam o argumento e por um enorme
conjunto de amigos que impõem o sorriso incrédulo perante cada cena, forçando o
casal a justificar sem convicção de maior a sua decisão.
De
novo o jogo de espelhos repetido e renovado assegurando ao espectador que o
dia-a-dia terá mesmo muito mais valor do que a rotina dentro dele o parece obviar.
Um
filme para afirmar a ciência e a arte que sempre existem no interior no quotidiano.
jef,
fevereiro 2025
«Volveréis
– Voltareis» (Volveréis) de Jonás Trueba. Com Itsaso Arana, Vito Sanz, Fernando
Trueba, Andrés Gertrúdix, Francesco Carril, Ana Risueño, Naiara Carmona, Pedro
Lozano, Jon Viar, Valeria Alonso, Miguel A. Trudu, Isabelle Stoffel, Lucía
Perlado, Simon Pritchard, Joserra Cadiñanos, Sigfrid Monleón, Bárbara Mingo, Camino
López, María Herrador, Emilio Rivas, Beatriz Hernández, Dominique You, Mercedes
Unzeta. Argumento: Jonás Trueba, Itsaso Arana e Vito Sanz. Produção: Javier Lafuente e Jonás Trueba. Fotografia:
Santiago Racaj. Música: Iman Amar, Guillermo Briales, Ana Valladeres. Guarda-roupa:
Laura Renau. Espanha, 2024, Cores, 114 min.
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