Este filme é estranho.
Deixa-nos uma sensação de incómodo, distância, silêncio agressivo.
A impressão de que estamos a olhar a sociedade através da lupa lenta e
minuciosa de um etólogo ou antropólogo que estuda o aquário, o terrário, o jardim
zoológico, a cidade.
Quatro amigas de longa data vão descobrindo, revelando, falando,
rodando sobre si próprias, circulando numa vida que parece esconder uma
conclusão. Ou um início. Todas andam em suspenso, na dependência do modo
masculino, aceitando-o ou rejeitando-o, mas evitando o diálogo ou o confronto.
As refeições terminam invariavelmente com segredos afirmados de modo confrangedor.
São todos educadamente inconvenientes. Claro que as actrizes que interpretam
Akari, Sakurako, Fumi e Jun, respectivamente Sachie Tanaka, Hazuki Kikuchi, Maiko
Mihara, Rira Kawamura, merecem totalmente os prémios que receberam por darem
corpo a personagens à beira de uma ruptura tão «reprimida», numa sociedade tão «intocável»,
com um percurso de cedência perante a revolta que não consegue mais ser
reprimida.
Contudo, repito, fico com a estranha sensação de ter
assistido a uma simples cine-novela de 5 horas e 17 minutos de duração, onde «tudo»
anda em torno de um certo «quase nada».
Talvez defeito meu.
Que saudades fiquei de Hirokazu Koreeda, Takeshi Kitano, Akira
Kurosawa, Nagisa Oshima, Yasujiro Ozu, Kenji Mizoguchi, que nos fazem crer que o Japão
é um poço emocional de criatividade, as suas refeições um
polo delicado de afecto e compreensão, que a sua tradição histórica, por mais
diferente que seja, transporta-nos para o coração estético de uma humanidade
que é una e indivisível.
Nota: a banda sonora é fantástica!
jef, outubro 2018
«Happy Hour: Hora Feliz»
(Happî awâ) de Ryûsuke Hamaguchi. Com Sachie Tanaka, Hazuki Kikuchi, Maiko Mihara, Rira
Kawamura. Japão, 2015, Cor, 317 min.
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