Não
há tempo a perder.
As
cenas iniciais de fuga desesperada do traficante perseguido pelo polícia Hamid
(Houman Kiai) terminam de modo brutal. Será uma das histórias que fará correr
ainda mais o incorruptível Samad (Payman Maadi) buscando provas e colocando
questões ao juiz (Farhad Aslani), tentando desenrolar o novelo da lei iraniana
que condena à morte tanto o maior traficante como o mais insignificante. Pelo meio, vai
ficando a queda do procurado dealer Naser Khakzad (Navid Mohammadzadeh) que se
deita calçado, não consegue dormir sem comprimidos, protege a família com unhas
e dentes e é traído pela ex-namorada lavada em lágrimas, Elham (Parinaz
Izadyar).
Tudo
o resto é a excepcional encenação cinematográfica sustentando esse número incompreensível
que dá o título internacional ao filme: «Just 6,5»! São 6,5 milhões de
iranianos envolvidos na síntese, no tráfico e no consumo de droga.
Este
diabólico thriller de acção surge
como uma verdadeira ópera onde o coro imenso e miserável de centenas de drogados
famintos fazem de regra e contra-regra, num palco sumptuoso apesar de exíguo, ao
ininterrupto diálogo dos actores que se iludem perseguindo uma verdade que
dificilmente sairá vencedora. Esses famélicos não são actores, são mesmo os desesperados
iranianos que a droga e a sua lei remete para o esgoto da cidade.
Não
há mesmo tempo a perder. Não podemos deixar de seguir o diálogo imparável e os
cenários de cores, tons e padrões magníficos. Mas profundamente tristes. Também
o sentido operático vem daí, desse subterrâneo ímpar, sujo, esventrado.
E
como consegue o realizador, sobre tudo isto, ainda colocar o ridículo irónico,
que faz sorrir ante o climax final, tão soturno quanto medonho?
Não
há tempo a perder porque devemos tudo olhar (já que não somos falantes de
iraniano).
Aqui,
não temos mesmo tempo a perder porque não podemos desviar a consciência do olhar.
Um filme imprescindível.
Um filme belo que me ficará na memória, junto do coração, como aqueles outros vindos
do grande cinema do Irão: «Close Up» e «Shirin» de Abbas Kiarostami (1990, 2008),
«O Círculo» e «Taxi» de Jafar Panahi (2003, 2015) ou «Uma Separação» de Asghar
Farhadi (2011).
jef,
junho 2022
«A
Lei de Teerão» (Metri Shesh Va Nim / Just 6.5) de Saeed Roustayi. Com Payman
Maadi, Navid Mohammadzadeh, Parinaz Izadyar, Farhad Aslani, Houman Kiai, Maziar
Seyedi, Ali Bagheri, Marjan Ghamari, Yusef Khosravi, Amir Hossein Mirchi, Mehdi
Hoseini-nia, Giti Ghasemi, Asghar Piran, Mohammad Ali Mohammadi, Peyman
Ghasemzadeh, Javad Pourheidari. Argumento: Saeed Roustayi. Produção:
Seyed Jamal Sadatian, Arastoo Sohrabinya, Mohammad Sadegh Ranjkeshan. Fotografia:
Hooman Behmanesh. Música: Peyman Yazdanian. Irão, 2019, Cores, 135 min.
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