Este
filme é estranho. Realizado mais de 30 anos depois de «O Sol do
Marmeleiro» (1992), um dos filmes que jamais esquecerei pela genial candura
como Víctor Erice oferece ao pintor Antonio Lopez, o tempo, a beleza e o
silêncio da espera. E nos ensina a contemplar a vida como se disfruta de uma natureza-morta exemplar.
Por
isso, preparei-me para um novo deslumbramento que logo aconteceu na pausa inicial
em que nos são dadas ver as cenas iniciais de um filme que está a ser realizado
por Miguel Garay (Manolo Solo) e onde nos é apresentado o pedido de um velho aristocrata
judeu em fim de vida, Mr. Levy (Josep Maria Pou), a um investigador privado
para que encontre e traga à sua presença a filha que terá deixado no Extremo Oriente.
Porém, tudo fica interrompido pois o actor e amigo de longa data do
realizador, Julio Arenas (José Coronado), desaparece sem deixar rasto antes de serem concluídas as filmagens.
Uma
investigação televisiva vem reacender o mistério e devolve a Miguel Garay a
vontade de tentar desvendar o desaparecimento do seu amigo e cúmplice de amores e desamores.
Estão
lançados os dados através de uma tranquila mas profunda reflexão sobre o tempo que passa sem deixar rasto, o fim do
cinema, a busca da identidade e a liberdade de desaparecer. Tudo se move em torno
de uma ausência e da perspectiva do final de linha. Para que servirá continuar
a tentar se nos é dada a liberdade de mudar de estação e fugir? Se também
temos a opção de obliterarmos a memória?
Tudo
é interrogado através de uma história extraordinariamente bem contada e por personagens profundamente construídos e bem caracterizados. Tudo é nostálgico e
belo.
Contudo,
à medida que o filme caminha para o fim, a narrativa parece começar a ficar presa em
pormenores cada vez mais factuais, digamos novelescos para não dizer
televisivos, e fui perdendo a poesia que no início me entregaram como
fulcro do enredo. E a cena final, em jeito de «Cinema Paraíso» (Giuseppe
Tornatore, 1988), é lenta, muito lenta, e desfaz um pouco a aura misteriosa que desde o
início fora prometida.
Mas ainda é uma grande filme, uma bela tarde de cinema.
jef,
dezembro 2023
«Fechar
os Olhos» (Cerrar los ojos) de Víctor Erice. Com Manolo Solo, José Coronado,
Ana Torrent, Petra Martínez, María León, Mario Pardo, Helena Miquel, Antonio
Dechent, Josep Maria Pou, Soledad Villamil, Juan Margallo, Dani Téllez, Alejandro
Caballero Ramis, Rocío Molina, Ana María, José Manuel Mansilla, Kao Chenmin, Venecia
Franco, Fulgencio Javier, Natalia Llorens. Argumento: Víctor Erice e Michel
Gaztambide. Produção: Víctor Erice, José
Alba, Odile Antonio-Baez, Agustin Bossi e Pablo Bossi. Fotografia: Valentín
Álvarez. Música: Federico Jusid. Espanha / Argentina, 2023, Cores, 169 min.
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