domingo, 2 de março de 2025

Sobre o livro «Vermelho Delicado» de Teresa Veiga, Tinta-da-China, 2024



 







É o primeiro livro de contos de Teresa Veiga que leio. Sete contos, para informação. Logo me toca esse lado rigoroso mas desprendido de nos colocar no lugar certo, na certa geografia. Confesso que os livros também me prendem pela descrição das arquitecturas onde as personagens circulam (sempre me atraíram as descrições de Eça de Queirós ou Júlio Verne). Os muros a isolarem a estalagem de Aldebarã no final de uma estrada local. O bosque com o riacho e uma ponte onde uma mulher se debruça alheada. Um edifício de pedra branca colocado no centro de um jardim cuidado à japonesa. A cidade dentro da qual alguém se perde pelas ruas mal cuidadas dos seus subúrbios. Uma casa grande onde atrás das portas se ouvem os sons do violino e do piano, com uma entrada pelas traseiras onde o chão possui um quadriculado de mosaicos pretos e brancos. O enorme casarão com umas escadas no interior onde alguém, bêbado, se debruça aos berros. Um restaurante com uma sala discreta que guarda a intimidade, no almoço de sobremesas partilhadas, de duas amigas. Dona Mena e Dona Laura.

Dentro dos contos, as mulheres circulam, determinadas, umas com sentido, outras sem ele, um pouco perdidas, mas sempre de semblante forte, em posição altiva, talvez mesmo adversa. As histórias, essas, nunca são as que esperamos, entre o mistério, a fantasia, talvez, por vezes, a raiar o policial.

E como a minha cabeça liga-se através de um algoritmo neurológico, lembrei de «Myra» de Maria Velho da Costa (2008), de «As Noites das Mulheres Cantoras» de Lídia Jorge (2011), de «Visitar Amigos e Outros Contos» de Luísa Costa Gomes (2024) ou «Antes do Degelo» de Agustina Bessa-Luís (2004). (Longe estão as serenas e melancólicas Maria Judite de Carvalho ou Maria Ondina Braga, também elas magníficas!)

Contudo, detesto separar escritas por género e sensibilidades, apesar de o ter feito exactamente no parágrafo anterior, culpa minha! Existe nestes contos um certo ambiente de mundos paralelos, de insólito e obscuridade fantasiosos, de insatisfação culpabilizada ou as casas com portas por franquear, também de  inconstância filosófica. Por isso veio ainda à memória «Os Passos em Volta» de Herberto Helder (1963) ou «A Liberdade de Pátio» de Mário de Carvalho (2013). Inclusive, o primeiro conto deste livro “A Estalagem de Aldebarã” recordou-me «O Barão» de Branquinho da Fonseca (1942). E isso é muito bom.


jef, março 2025

 


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