Este é o primeiro e-book que tenho. E é muito bom. É do André Ruivo e está a meio caminho entre o livro e o filme de animação. Melhor, está próximo visualmente da memória que tenho do primeiro View Master em baquelite castanha que os nossos pais nos ofereceram, com vistas de Bruxelas, ou das primeiras sessões de slides vistas em família com o alto patrocínio da Kodachrome.
É um livro luminoso, espampanante, algo delirante ou alucinado pela própria luz. Livro para se ver em sala escura,
como um filme, como um livro aberto, próximo do mais pequeno e anterior parente, «As
Aventuras de Qualquer Coisa», Stolen Books 2018.
Aproximamo-nos da cidade, ou ela se vai chegando ao nosso olhar. Uma
árvore, uma ondulação suave na paisagem ocre, um renque de árvores. Eis uma
casa! Será um monte de paredes brancas e janela iluminada? Não. É mesmo a
cidade que regressa. Um prédio, quatro andares, um candeeiro. Afinal, dois.
Estamos perto. A urbe adensa-se geograficamente, geometricamente. Sugere
domésticos paralelepípedos em modo nocturno e televisivo. Ora é noite, ora é dia.
A luz não é igual mas as sombras permanecem. Aprofunda-se o mistério humanizado
sem humanos à vista. Cidade fantasma mas com energia suficiente para se ouvir o
estrondo dentro de uma das casas. As linhas rectas arredondam-se em curva,
empurradas pelos trovões afunilados pelas ruas que se estreitam. As chaminés fumam, as janelas
alumiam-se. A tempestade está a um passo, a inundação invade a claridade. Na página 33, o escarlate é berrante mas a cidade
recompõe-se. De momento, os muros erguem-se na gravidade negativa, os
tijolos e as luzes reflectem-se como repreendendo as guaritas de fronteira.
Entre elas, dois homens. O transeunte, o traficante, o contrabandista, o
resistente, o simples cidadão, é interpelado pela autoridade que não sabe bem
se é mandante, algoz, esbirro ou chefe da banda!
É a história que eu lhe faço! Temos sempre o direito (talvez
o dever) de as refazer.
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jef, fevereiro 2020
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