O
melhor desta singela comédia é que ela própria não se leva a sério e vai
brincando sem lógica factual mas com toda a eterna ilógica da banda desenhada e
dos desenhos animados. Nestes, os heróis, os Bip Bips e os Coyotes da Warner,
são cilindrados a cada curta-metragem e logo surgem na seguinte, penteados e
sem uma pinga de sangue sobre o pêlo ou a pena. Aqui são os próprios tédio e a
rotina diários que aparecem como figuras centrais prontas a serem degoladas.
Contudo, o cartoonista José (Daniel Hendler) que é despedido e se torna dono de
casa e baby-sitter da pequenina Antonia, dá-lhe a tranquilidade da rotina e
vê-se obrigado a assassinar o vizinho Jean-Claude (Melvil Poupaud), personagem
cabotina e sobejamente enervante, viciado em «Petite Fleur» na bela versão delicodoce
de Sidney Bechet. Só que a morte fica-lhe bem e, no dia seguinte, Jean-Claude
volta a surgir, ainda mais cabotino e exasperante. Sem uma pinga de sangue no
fato impecável. O assassino reiterado vê-se, nessas situações, imbuído de uma
libido explosiva que devolve outro vigor à relação com que a incansável
trabalhadora e mãe Lucie (Vimala Pons). Contudo, o casal vê-se obrigado a
consultar um psicólogo-médium-xamã, não menos cabotino e enervante. José tenta
o mesmo método mas não resulta tão bem.
Pelo
meio, ainda se ouve uma versão arqueológica de «Capri c’est fini» pelo próprio
e contemporâneo Hervé Vilard.
jef,
junho 2023
«Petite
Fleur» de Santiago Mitre. Com Melvil Poupaud, Daniel Hendler, Vimala Pons,
Sergi López, Françoise Lebrun, Éric Caravaca, Hervé Vilard, Amapola Golzman, Calypso
Roure, Eva Zayas Brito Cornet, Jean-Luc Piraux, Luca Denti, Fabrice Adde.
Argumento: Santiago Mitre e Mariano Llinás segundo o romance de Iosi Havilio.
Produção: Didar Domehri e Agustina Llambi-Campbell. Fotografia: Javier
Julia. Música: Gabriel Chwojnik. França / Argentina / Bélgica / Espanha, 2022, Cores,
98 min.
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