Este é um muito belo mas agreste filme
sobre a vida miserável da infância nos subúrbios da cidade do México. Parecendo
“neo-realista” pelo apelo inicial às forças progressistas do futuro, logo dá o
dito pelo não dito avisando que a coisa que vamos ver não será optimista.
Talvez, então, “realista”…Também não. A tensão
que apresenta, entre a carga onírica e a força erótica, retira a atenção do ‘objecto
social’ e coloca-a sobre o desejo interior por realizar de cada um dos personagens.
As cenas de sedução entre a mãe de Pedro (Stela Inda) e ‘El Jaibo’ (Roberto
Cobo) ou as cenas do sonho-pesadelo de Pedro (Alfonso Mejía) condensado no
desejo pela mãe que o repudia, terminando na disputa pelo pedaço de carne crua
entre ele e ‘El Jaibo’, são tão explícitas que não deixam margem para
interpretações directamente ‘políticas’.
Também pouco tem de ‘romantismo’. Mais uma
vez, o simbolismo e as suas interpretações. Os galos e as galinhas que
representam a morte ao aproximarem-se da personagem ou são mortas elas mesmas à
paulada; a violência extrema dos jovens sobre D. Carmelo, o cego (Miguel Inclán), ou sobre o aleijado que fica sem o carro de apoio que rola rua abaixo; ou as
cenas eróticas em que Meche espalha leite de burra nas pernas ou quando ela se
vê no colo libidinoso de D. Carmelo e aponta-lhe a faca; ou quando o pedófilo
(Charles Roomer) tenta seduzir Pedro (olhados através do silêncio do vidro de
uma montra), digamos que o filme tudo está impregnado uma pulsão sexual máxima e de uma brutal vontade de destruição.
Só ultrapassada pela imagem de morte de ‘El Jaibo’ secundado no estertor final
por um cão que corre sobre a imagem e a do corpo de Pedro a rolar lixeira a baixo a um segundo da palavra 'fin'.
Difícil de definir a genial arquitectura
deste drama que expõe a violência como modo estético e a ausência-presença de
afecto condensada simplesmente na oferta e na devolução do colar com o redentor dente
de um morto do cemitério por parte de ‘Ojitos’ (Mario Ramirez) a Meche.
(Fiquei a pensar que relação teria este
filme – dentro de mim – com «Juventude Inquieta / Rumble Fish» Francis Ford Coppola
1983, «Amor Sem Barreiras / West Side Story» Jerome Robbins & Robert Wise
1961, «Ladrões de Bicicletas» Vittorio De Sica 1948, «Aniki Bóbó» Manoel de Oliveira
1942).
jef, julho 2019
«Os Esquecidos» (Los Olvidados) de Luis
Buñuel. Com Alfonso Mejía, Stela Inda, Miguel Inclán, Roberto Cobo, Alma Delia
Fuentes, Francisco Jambrina, Efrain Arauz, Javier Amezcua, Mario Ramirez, Juan
Villegas, Jorge PérezJesús Garcia Navarro, Hector López Portillo, Ángel Merino,
Ramón Martinéz, Diana Ochoa, Francisco Muller, Salvador Quiroz, José Moreno
Fuentes, Charles Roomer, Ignacio Solorzano. Argumento: Luis Buñuel e Luis
Alcoriza. Fotografia: Gabriel Figueroa; Música: Rodolfo Halffter sobre temas de
Gustavo Pittaluga. Produção: Ultramar Filmes, Oscar Dancigers e Jaime Menasco.
1950, México, P/B, 80 min.
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