Filme
teórico, erótico, louco e livre. Tudo o que aqui se diz e se olha está inscrito
nas sagradas escrituras ou no seu contrário: as heresias, os anátemas, as
maldições, os milagres, a devoção, a repugnância, o corpo, a alma, o sexo, a excomunhão.
Temos de seguir João (Laurent Terzieff) e Pedro (Paul Frankeur) que vão em
peregrinação de Paris a Compostela, em homenagem ao apóstolo Tiago que pode nem
estar ali enterrado. Falam Cristo (Bernard Verley) que se prepara para rapar a
barba, impedido pela Virgem Maria (Edith Scob) que se revela com um rosário no
alto de uma árvore a uns estudantes jacobinos atónitos e convertidos (Denis
Manuel, Daniel Pilon). Fala o diabo (Pierre Clémenti) que promove desastres
rodoviários. Fala o devoto Marquês de Sade (Michel Picolli), a prostituta acolhedora
(Delphine Seyring) e o padre do albergue espanhol ávido pelo divino voyeurismo (Julien
Guiomar).
É
uma espécie de testemunho religioso de Luis Buñuel a partir da sua própria
leitura tão atenta das sagradas escrituras e de tudo o que elas provocam de
confusão, interpretação, negação, olhado através de uma sucessão de quadros que
aparecem sem regra geográfica ou temporal aos olhos dos peregrinos Pedro e João
(e dos espectadores). Tal como as estrelas que parecem caóticas a quem as olha
mas organizadas numa galáxia láctea e que levava os devotos pelas estradas até São
Tiago, em Compostela.
Este
filme é o absoluto oposto de «A Vida de Brian» dos Monty Phyton (1979).
jef, junho 2020
«A
Via Láctea» (La Voie Lacteé) de Luis Buñuel. Com Paul Frankeur, Laurent
Terzieff, Pierre Clémenti, Bernard Verley, Edith Scob, Denis Manuel, Daniel
Pilon, Alain Cuny, François Maistre, Julien Bertheau, Michel Picolli, George
Marchal, Jean Piat, Muni, Agnès Capri, Claudio Brook, Jean-Claude Carrière,
Marcel Pérès, Delphine Seyring, Michel Eichéverry, Julien Guiomar. Argumento:
Luis Bñuel e Jean-Claude Carrière. Fotografia: Christian Matras. França /
Itália, 1969, Cores, 102 min.
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