quarta-feira, 24 de junho de 2020

Sobre o filme «O Anjo Exterminador» de Luis Buñuel, 1962





 






Talvez ainda mais livre que «Veridiana», realizado um ano antes, por corromper os códigos narrativos. Ainda mais “surrealista” que «Um Cão Andaluz» (1929) ou «A Idade do Ouro» (1930) por ausência de regras impostas previamente, esta é uma fábula que contém todas as virtudes de uma parábola bíblica que se repete, de uma história infantil que se conta, várias noitesseguidas, para adormecer. E para amedrontar.

Um grupo de comensais da alta sociedade é convidado para uma ceia na casa de um dos casais, após uma noite na ópera. Tudo parece correr de feição quando os criados sentem, nessa noite, uma irreprimível necessidade de se ausentarem à socapa. O urso parece estar contente. Os carneiros devem sair imediatamente debaixo da mesa e ir para o quintal. A ceia será servida do fim para o princípio. O problema surge quando, por um acto de boa disposição, de má educação, ou impedimento não factual, os convivas resolvem ficar, todos, a pernoitar no salão nessa noite. E na noite seguinte. E na noite seguinte… Não há volta a dar, estão encarcerados. Ninguém pode também lá entrar.

O absurdo aqui é levado por essa linha de história onírica que ninguém parece dominar, excepto se usar a repetição inicial. Os convivas entram duas vezes em cena, os amigos cumprimentam-se várias vezes como se fosse a primeira. O palco prepara-se para receber a sonata de Paradisi. O palco está pronto para o confinamento e para a morte. Porém, tudo pode regressar ao bem final. Igualmente, tudo pode regressar ao mal inicial. E os carneiros entrarão, de novo, na igreja pelo adro.

jef, junho 2020


 «O Anjo Exterminador» (El Ángel Exterminador) de Luis Buñuel. Com Silvia Pinal, Jacqueline Andere, José Baviera, Augusto Benedico, Luis Beristáin, Antonio Bravo, Claudio Brook, César del Campo, Rosa Elena Durgel, Lucy Gallardo, Enrique García Álvarez, Alberto Roc, Ofelia Guilmáin, Juana Avila, Nadia Haro Oliva, Tito Junco, Xavier Loyá, Xavier Massé, Ofelia Montesco, Patricia Morán, Patricia de Morelos, Bertha Moss, Enrique Rambal, Pancho Córdova, Ángel Merino, Luis Lomelí. Argumento: Luis Buñuel e Luis Alcoriza baseado na obra de José Bergamin “Los Naufragos de la Calla Providencia”. Produção: Gustavo Alatriste. México, 1962, P/B, 93 min.


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