terça-feira, 15 de setembro de 2020

Sobre o filme «Paixão Proibida» de Tony Richardson, 1959

 




































Jimmy Porter (Richard Burton) é um homem vindo do operariado, dotado, inteligente, sensível, trompetista de sucesso nas horas vagas, nas outras vendedor de rebuçados num mercado de rua a meias com o amigo Cliff (Gary Raymond), com o qual partilha uma velha mansarda. Jimmy é casado com Alison (Mary Ure), uma rapariga de origem abastada que o ama, apesar de tudo. Mas, acima de tudo, Jimmy é um jovem irado que se revolta contra uma sociedade apodrecida que se lhe entranha nos ossos e nas células e o faz odiar tudo e todos, tornando a vida, a sua e a de quem lhe pertence, num inferno. Alison diz para o seu pai que, a custo, regressara de uma Índia descolonizada:

«Está magoado porque tudo mudou, Jimmy está magoado porque tudo continua igual, e nem um nem o outro consegue entender isto. Algures, qualquer coisa está errada, não está?»

A mansarda, onde também chegará Helena (Claire Bloom), amiga de Alison, é um palco fechado, intenso, sem pontos de fuga, onde a ira e a agressividade se concentram e não dão tréguas ao amor. Um lugar em que as expressões são filmadas de tão perto que chega a parecer intruso o próprio espectador. Espaço claustrofóbico que não é tranquilizado pelas magníficas cenas de mercado; das crianças que correm entusiasmadas; dos velhos nos bancos de jardim; das canções do Exército de Salvação; do bar onde o bebop é freneticamente tocado e dançado. Nem sequer as cenas finais na estação de comboios dão algum tom de reconciliação entre Jimmy e Alison que, entre sombras e vapor, olham-se, amam-se, mas não se chegam a beijar.

Este é um filme realizado numa época em que a guerra, o colonialismo, as injustiças sociais, o desespero emocional e o desequilíbrio psicológico, mas também o rigor do esteta, faziam parte integrante de um novo teatro que se situava no centro de um novo cinema. Cinema que desejava intervir na mudança cultural (e política) de uma sociedade que se desengonçava sobre os próprios fundamentos, os seus velhos alicerces.


jef, setembro 2020

«Paixão Proibida» (Look Back in Anger) de Tony Richardson. Com Richard Burton, Claire Bloom, Mary Ure, Edith Evans, Gary Raymond, Glen Byam Shaw, Phyllis Neilson-Terry, Donald Pleasence, George Devine, Walter Hudd, Nigel Davenport, Alfred Lynch, Toke Townley, S. P. Kapoor. Argumento: Nigel Kneale segundo a peça de teatro de John Osborne que lhe acrescentou diálogos. Produção: Harry Saltzman e Gordon Scott. Fotografia: Oswald Morris. Música: Chris Barber. Grã-Bretanha, 1959, P/B, 98 min.

 

 

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