Jimmy Porter (Richard Burton) é um homem vindo do operariado,
dotado, inteligente, sensível, trompetista de sucesso nas horas vagas, nas
outras vendedor de rebuçados num mercado de rua a meias com o amigo Cliff (Gary
Raymond), com o qual partilha uma velha mansarda. Jimmy é casado com Alison (Mary
Ure), uma rapariga de origem abastada que o ama, apesar de tudo. Mas, acima de
tudo, Jimmy é um jovem irado que se revolta contra uma sociedade apodrecida que
se lhe entranha nos ossos e nas células e o faz odiar tudo e todos, tornando a
vida, a sua e a de quem lhe pertence, num inferno. Alison diz para o seu pai
que, a custo, regressara de uma Índia descolonizada:
«Está magoado porque tudo mudou, Jimmy está magoado porque
tudo continua igual, e nem um nem o outro consegue entender isto. Algures, qualquer
coisa está errada, não está?»
A mansarda, onde também chegará Helena (Claire Bloom), amiga de Alison, é um
palco fechado, intenso, sem pontos de fuga, onde a ira e a agressividade se
concentram e não dão tréguas ao amor. Um lugar em que as expressões são
filmadas de tão perto que chega a parecer intruso o próprio espectador. Espaço
claustrofóbico que não é tranquilizado pelas magníficas cenas de mercado; das
crianças que correm entusiasmadas; dos velhos nos bancos de jardim; das canções
do Exército de Salvação; do bar onde o bebop é freneticamente tocado e dançado.
Nem sequer as cenas finais na estação de comboios dão algum tom de
reconciliação entre Jimmy e Alison que, entre sombras e vapor, olham-se,
amam-se, mas não se chegam a beijar.
Este é um filme realizado numa época em que a guerra, o
colonialismo, as injustiças sociais, o desespero emocional e o desequilíbrio
psicológico, mas também o rigor do esteta, faziam parte integrante de um novo
teatro que se situava no centro de um novo cinema. Cinema que desejava
intervir na mudança cultural (e política) de uma sociedade que se desengonçava
sobre os próprios fundamentos, os seus velhos alicerces.
jef, setembro 2020
«Paixão Proibida» (Look Back in Anger) de Tony Richardson.
Com Richard Burton, Claire Bloom, Mary Ure, Edith Evans, Gary Raymond, Glen
Byam Shaw, Phyllis
Neilson-Terry, Donald Pleasence, George Devine, Walter Hudd, Nigel Davenport, Alfred Lynch, Toke
Townley, S. P. Kapoor.
Argumento: Nigel Kneale segundo a peça de teatro de John Osborne que lhe acrescentou
diálogos. Produção: Harry Saltzman e Gordon Scott. Fotografia: Oswald Morris.
Música: Chris Barber. Grã-Bretanha, 1959, P/B, 98 min.
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