sábado, 17 de julho de 2021

Sobre o filme «O Amor às 3 da Tarde» de Éric Rohmer, 1972























Quando “lemos” os filmes de Éric Rohmer ficamos sem saber muito bem se devemos sorrir da tragédia comum do dia-a-dia, se angustiar com a comédia de um dia-a-dia que nos leva a um lugar não muito seguro.

Este filme é exemplo disso.

Ficamos ainda sem saber se é literatura o que ouvimos através dos pensamentos de Frédéric (Bernard Verley), homem de negócios bem instalado na vida, mulher e filho encantadores, que se satisfaz em morar nos arrabaldes de Paris, pois a concedida viagem de comboio de St. Cloud à Gare St. Lazare dá-lhe a oportunidade de ler um bom livro com a concentração que os jornais não lhe trazem.

Duvidamos se não estamos a assistir a uma peça de teatro dado o tamanho rigor na marcação das cenas, das entradas e saídas das personagens, do abrir e fechar constante de portas, dos sorrisos velados mas ostensivos quando surge no escritório de Frédéric uma amiga vinda de um passado que talvez ele deseje esquecer, Chloé (Zouzou), libertária e libertadora, sem amarras ou futuros sociais e familiares, procurando emprego, afecto amoroso e um pai para um filho que deve ter olhos azuis tal como os de Frédéric.

Ficamos sem saber, afinal, se a verdadeira personagem do filme não é aquela multidão de figurantes citadinos parisienses onde Frédéric gosta de mergulhar e surfar libertando-se das grilhetas da vida que escolheu, sedentária, segura, confortável, amigável, amorosa, mas universalmente entediante.

Um filme que nos prova com extremo humor, fria sabedoria e delicada estética o erro sistemático das nossas opções.

 

jef, julho 2021

«O Amor às 3 da Tarde» (L’amour, l’après-midi) de Éric Rohmer. Com Bernard Verley, Zouzou, Françoise Verley, Daniel Ceccaldi, Malvina Penne, Babette Ferrier, Françoise Fabian. Argumento: Éric Rohmer segundo romance «Contos Morais» do próprio. Produção: Pierre Cottrell, Barbet Schroeder. Fotografia: Néstor Almendros. Música: Arié Dzierlatka. Guarda-roupa: Daniel Hechter-Vog. França, 1972, Cores, 93 min.

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