Posso dizer que não sou o
maior fã do realizador Ryûsuke Hamaguchi. Todos os filmes que vi da sua lavra
me parecem sobejar no respectivo tempo de exibição sem conseguirem emocionar-me
totalmente, ficando eu a tentar descobrir um motivo válido para tantos minutos.
E digo isto, apesar da fotografia, da cenografia ou da música serem francamente
boas. Acho que falta dramaturgia para as personagens que sempre ficam pela
superfície, em busca de um climax que nunca aparece.
Contudo, em «Drive My
Car», encontro um enorme respeito pela peça «Tio Vânia», um marco incontornável
da teatralidade universal, da angústia nostálgica e da ternura fim de século
com que Anton Tchékhov cobre majestosamente as suas criaturas e toda a humanidade.
Ryûsuke Hamaguchi
consegue com a lentidão necessária colocar a par e passo o luto eterno do
encenador e actor Yûsuke Kafuku (Hidetoshi Nishijima) com o drama intrínseco de
Vânia.
Contudo, mais
surpreendente é o papel superlativo que a motorista de Kafuku, Misaki Watari,
vai assumir mais à frente, e quase em silêncio, ocupando todo o filme. A actriz
Tôko Miura consegue adensar emocionalmente o filme como nenhuma outra actriz
conseguiu em anteriores filmes de Hamaguchi.
Pena (mais uma vez) que o
filme não aprenda com Tchékhov a reservar no silêncio das palavras o todo que o
espectador guardaria para si, confirmando a desnecessária necessidade que o
realizador sente em contar tudo tim-tim por tim-tim, deixando para trás essa
magia dramática da história que poderia completar-se (permanecendo e ressoando)
dentro de nós.
jef, março 2022
«Drive My Car» (Doraibu
Mai Kâ) de
Ryûsuke Hamaguchi. Com Hidetoshi Nishijima, Toko Miura, Masaki Okada, Reika
Kirishima, Park Yu-rim, Jin Dae-yeon, Sonia Yuan, Ahn Hwitae, Perry Dizon, Satoko
Abe, Hiroko Matsuda. Argumento: Ryusuke Hamaguchi e Oe Takamasa, baseado no
conto de Haruki Murakami. Produção: Kazuo Nakanishi e Yûji
Sadai. Fotografia: Hidetoshi Shinomiya. Música: Eiko Ishibashi. Japão, 2021, Cores,
179 min.
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