Dizem que é a arte de Robert Walser. Essa arte escrita em pé
de página, borda da mesa, bilhete de autocarro, guardanapo de papel. Histórias
curtas, meia página, talvez menos, dizendo tudo por palavras mínimas,
fazendo crer que as 24 horas de um dia, afinal, podem ser a eternidade da
fantasia e da leitura sonhada. Uma espécie de desenho efémero encontrado entre o espaço das nuvens ou nas pedras da calçada.
Que mais há a dizer além de «A arrumadora de carrinhos de
choque», «O imitador de tiques» ou «A enfermeira de cuidados extensivos» ou
apenas da pergunta: «Os sonhos são livres?»
E não é verdade que quantas vezes no dia atarefado não
reparámos que por nós acabou de passar uma bela história? «Era uma vez um velho
pescador, um romance policial e um secador de cabelo.»
A leitura do mundo ilustrado de Alexandra Ramires e Regina
Guimarães fornece ao leitor a sumptuosa verdade (ou, pelo contrário, a afectuosa
frontalidade) de um mundo que só pode ser gerido e interpretado (talvez
suportado) através do seu contrário.
Robert Walser escreveu mais de mil deliciosas histórias
curtas e aos 51 anos internou-se voluntariamente num manicómio. O russo Daniil
Harms praticava a “poesia zaum” (linguagem fora do contexto) e foi letalmente
perseguido. Hölderlin chamava Deus à Natureza e chamaram-lhe louco e romântico.
Mário-Henrique Leiria inventou o gin-tónico. Kafka metamorfoseou-se.
A realidade para existir tem de ser constantemente inventada e Regina Guimarães e Alexandra Ramires dão uma grande ajuda!
jef, março 2022
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