Este filme é um dos mais belos filmes de Charlie Chaplin. É
um filme de mudança, de reorganização do cansaço da sua criatividade. É um
filme de estudo. Uma curta-metragem que é também uma
longa-metragem. Trata-se da sublimação do seu passado trágico e da catarse de
uma recente tragédia. A morte do filho recém-nascido, filho da muito jovem e
fugaz esposa, a actriz Mildred Harris, em 1919.
«O pecado da maternidade».
As palavras surgem após a epígrafe temática:
«Uma comédia com um sorriso e, talvez, uma lágrima».
A mãe (Edna Purviance) sai do hospício com um recém-nascido
nos braços. Está desesperada e acaba por deixá-lo no banco de um luxuoso
automóvel estacionado num bairro de ricos. A criança traz uma nota manuscrita
entre as roupas: «Quem a encontrar, ame-a e cuide bem dela.»
O automóvel é roubado e a criança colocada no lixo pelos
ladrões numa esquina do bairro paupérrimo onde vive Charlot. Ele sai de casa,
escapa por um triz a um monte de entulho lançado por uma janela. Encontra o bebé
e suspeita que tenha sido atirado também pela janela. Tenta deixá-lo perto de alguma mãe. Não consegue. Finalmente, adopta-a!
Ou antes, é The Kid (Jackie Coogan) que adopta Charlot e passa
a protegê-lo e a educá-lo através de uma sucessão extraordinária de cenas
cómicas. As peripécias sucedem-se até que Charlot, triste e desamparado, adormece sozinho
à porta de sua pobre casa. Então, sonha que o bairro é o Paraíso cheio de
anjos. Mas o paraíso é também nefasto e os anjos viciosos.
É acordado por um polícia que o agarra e o leva para a
esquadra…
O resto, sabemos nós.
«O Garoto de Charlot» é um filme triste e terno, comovente,
cómico, romântico e realista, sobre a ideia falsa de que a infância encerra,
por norma, a alegria e a felicidade. Um filme sobre a infância que fica guardada
na vida adulta. Um dos filmes mais firmemente sociais criados pela extraordinária
figura do maior palhaço do mundo.
jef, janeiro 2018
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