É preciso ser um enorme realizador para conseguir aproximar
a câmara do rosto de cada uma destas figuras e tocar-lhe esse silêncio que mais
parece um abismo.
É preciso ser um mestre na direcção de actores para colocar-lhes
em falas uma tal intenção emocional, uma tão grande capacidade de dizer tudo em
tão poucas palavras, palavras tão “banais”, e contar-nos o seu passado, a génese do
futuro, avizinhando-se como um tornado do centro dramático deste filme-teatro.
A festa dos 21 anos de Roxanne Purley (Claire Rushbrook), filha segunda de Cynthia
Rose Purley (Brenda Blethyn), em casa do seu amado e apaziguador tio, Maurice
Purley (Timothy Spall), casado com a nevrótica e amante de estampagens, Monica
Purley (Phyllis Logan). Festa onde os segredos ou as mentiras se irão revelar
fundamentos de uma sociedade dura, ancestralmente miserável, mas sustentada por
um amor sedimentado no profundo desejo familiar.
Genial é o humor a roçar o non-sense de certas cenas de
descompressão dramática. Genial, o guarda-roupa e os decores.
Genial, tanto a figura-pilar de Maurice Purley, como o
caminho de encontro com a mãe biológica de Hortense Cumberbatch (Marianne Jean‑Baptiste).
Personagens tão fortes quanto o são o namorado de Roxanne, Paul (Lee Ross), a empregada de Maurice, Jane (Elizabeth Berrington) ou a técnica do centro de registo
de adopções (Lesley Manville).
Sem dúvida genial, o final feliz entre as ruínas tristes de
uma sociedade que necessita a explicação urgente e amorável do grande Mike Leigh.
jef, novembro 2018
«Segredos e Mentiras» de Mike Leigh. Com Timothy
Spall, Brenda Blethyn, Phyllis Logan, Marianne Jean-Baptiste, Claire Rushbrook,
Ron Cook, Lesley Manville, Elizabeth Berrington, Michele Austin, Lee Ross, Emma
Amos, Hannah Davis. Música: Andrew Dickson; Fotografia: Richard Pope. GB / França, 1996,
Cores, 136 min.
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