Se se fala muito de Hitchcock ao sabor deste filme é porque
Truffaut também entrega o enredo ou a intriga nas mãos da teatralidade
rigorosa, dos decores e cenários milimétricos, da encenação dramática, da
marcação de cena, fazendo crer ao espectador que a irrealidade é verosímil.
Hitchcock fazia-o com mão de mestre, Truffaut segue-o de perto. O que interessa
ao realizador francês é uma espécie de brincadeira deixando a atenção de quem
vê presa ao suspense narrativo e, depois, rechear tudo com puro acto
estético. O guarda-roupa é extraordinário e a vingadora, crua e sistemática,
traz sempre atrás um single em vinil
para poder ouvir um concerto de bandolim num pick-up portátil.
E tal como Hitchcock, Truffaut sabe bem contar a história do
meio para o início e, a seguir, voltar ao meio para concluir o caso.
Mas, acima de tudo, o realizador entrega a gestão do filme no
rosto, nas mãos, no corpo de Jeanne Moreau, essa infalível femme fatale Julie
Kohler, que tenta através dos seus actos conquistar a memória de um passado que
teria tudo para ser idílico. Truffaut adorava as suas actrizes. Hitchcock
também. Só que nem sempre este último as colocava moralmente no centro da
intriga social. Truffaut, sim!
E talvez tenha sido essa característica ou imagem da forte e fria
vingadora Julie Kohler que domina os homens, afinal, tão cobardes, que tenha
apaixonado o amorável Quentin Tarantino e o tenha levado a ‘substituir’ Jeanne
Moreau por Uma Thurman em «Kill Bill» (2003 / 2004).
Ah, é verdade! Sem esquecer a música de Bernard Herrmann!
jef, março 2020
«A Noiva Estava de Luto» (La Mariée Était en Noir) de François
Truffaut. Com Jeanne Moreau, Michel Bouquet, Charles Denner, Claude
Rich, Michael Lonsdale, Daniel Boulanger, Alexandra Stewart, Sylvine Delannoy, Luce Fabiole. Argumento: François Truffaut e Jean-Louis
Richard a partir do romance de Cornell Woolrich. Fotografia: Raoul Coutard.
Som: René Levert.
Música: Bernard Herrmann. França, 1967, Cores, 107 min.
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