Gosto
muito deste disco. Na música popular a essência da novidade está, exactamente,
em repetir segundo o coração que a ouve. E Carla Bruni repete-me bem algumas
das canções nele instaladas mas sem macular a memória que delas guarda, adicionando-lhes
ainda a dose justa de falta de vergonha e desfaçatez que dão aquele toque
especial de estarmos a pisar terra de incréu.
Juntar
Depeche Mode «Enjoy de Silence» (já que as palavras magoam) com Clash «Jimmy
Jazz», «Love Letters» de Dick Haynes e «Miss You» dos The Rolling Stones, não seria
razoável.
Renegociar
o «The Winner Takes it All» dos Abba, colocando-o mesmo antes do «Crazy», em
dueto com o próprio Willie Nelson, e depois atirá-lo para os braços dos AC/DC
(«Highway to Hell»), tem que se lhe diga.
Ir tocar
na perfeita «A Perfect Day» de Lou Reed e colá-la a «Stand by Your Man» (Tammy
Wynette), que me traz à memória a extraordinária Dolly Parton, ultrapassaria os
limites.
Mas, pior,
terminar recordando Rita Hayworth em «A Dama de Xangai», com «Please Don’t Kiss
Me», ou a intocável «Moon River» cantada por Audrey Hepburn em «Breakfast at
Tyffany’s», seria razão para mandato de prisão imediata!
Mas o raio
do disco roubou-me o músculo cardíaco. Carla Bruni deixa a sua voz de Nouvelle
Vague / Nouvelle Chanson ao sabor dos arranjos cirurgicamente simples e
discretos de Davis Foster que sabem acarinhar e esconder a sua afinada
desafinação.
Mas se não
gosta da forma sussurrada, por vezes adolescente no vibrato, por vezes quebrada
no pianíssimo, entre o jazz de bar de hotel e a jukebox de um diner madrugada
dentro, não vai ser agora. Esqueça! Esqueça também Sarkozy!
Carla
Bruni continua a ser o que sempre foi… a cantar o que sempre quis.
E continua linda de morrer nestas fotografias de antologia realizadas
por Mario Sorrenti, esse tal…jef, novembro 2017
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