O
passado e o presente.
Aqui
se conta a sentida história de um século que é, dramaticamente, passado. E se é
bem verdade a afirmação de José Pacheco Pereira sobre o livro: “O dilema da
minha geração é que, ao mesmo tempo que se queria saber tudo (e durante uns
anos poder tudo), não se queria perder a inocência” (Ípsilon, 11 de Maio de
2007), também é certo que a nostalgia (talvez antes melancolia) que perpassa
todo o «Século Passado» está cuidadosamente encenada, diria dramatizada para
levar o espectador-leitor a uma percepção emotiva muito precisa. E, nisso, a
mestria de Jorge Silva Melo não é de todo inocente. Não é por acaso que este
conjunto de artigos, notas, apresentações críticas e crónicas de jornal não se
apresentam de forma redutoramente cronológica, nem sequer afloram a obra
contemporânea vivida pelo autor, nem teatros ou amigos presentes, como está
ressalvado em nota final. É notório que a pretensão é a de construir a história
de um mundo de sonho, de utópica ilusão, de ilusória esperança que só no
passado ficcionado pela memória e pela arte dramática é possível. Assim se
exploram, em capítulos expressamente não diários, esse Ser Cinema, esse Ser
Teatro, esse Ser Arte, lançados num país sem liberdade mas deliciosamente
espicaçado pela juvenil maquinação omnipotente, seres ancorados ainda na
ferocidade da escrita e na intransigência da imagem cinematográfica. Mas
também, mais tarde, esquecidos pelo mercado de uma certa “liberdade económica”.
Este é um livro sobre a morte e a vida, que se deve ler como romance que é, da
primeira à última página, seguindo os passos de personagens como João Bénard da
Costa, João César Monteiro, Fiama Hasse Pais Brandão, Mário Dionísio, Glicínia
Quartim ou Sofia Areal, deambulando numa Lisboa de praças, cafés e jardins
públicos e na intimidade que estes sempre fabricam. Um espaço público e privado
onde ainda encontramos Jacques Tati, John Ford, Howard Hawks ou Alfred
Hitchcock em sublimes retratos de maioridade crítica. Um livro sem medo de ser
emocionalmente adjectivador, mordaz e, porque não, fúnebre, que reconhece na
esperança maior, por mais ilusória que seja, força digna de mover montanhas.
Uma montanha mágica, futura, que até pode acontecer em Montemor-o-Velho
enquanto o sol desce sobre os plácidos campos do Mondego…
E
deste modo, o pano desce no fim do primeiro acto.
jef,
setembro 2007
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