Existe
aqui uma descomunal intuição para a diversão cinematográfica. Uma verdadeira híper-actividade
em justapor as melhores personagens dentro dos melhores actores em movimento nos
melhores cenários. E, antes de mais, uma narrativa truncada cronologicamente que
constrói uma história sem fim feita de histórias que poderiam nunca mais
terminar. E claro, a inteligência em colocar todos os temas no melhor diálogo.
Uma ironia que logo começa quando o dicionário nos explica que uma «Pulp
Fiction» não deve ser levada a sério. Mesmo que o profeta Ezequiel (25:17) nos
avise, por diversas vezes, que os bons irmãos vivem rodeados de tremenda iniquidade
por todos os lados excepto um, e que só a furiosa raiva nos poderá salvar. Ou
que na Europa continental, lá porque usam o sistema internacional das medidas,
falam em «Royale with Cheese» quando se trata de hambúrgueres. Ou nos explicam
que uma massagem nos pés pode ter interpretações bem mais complexas que uma
relação sexual extramatrimonial e lavar a consequências extremas. Ou que
existem certas situações ocorridas entre inimigos viscerais que só podem ser sanadas
pela silenciosa cumplicidade entre ambos. Ou a saber o melhor lugar onde
guardar um relógio em tempo de guerra. Ou que é muito mais rentável assaltar um
‘diner’ que um banco, pois neste todos se escudam em seguros e peripécias
financeiras para não entregar o dinheiro…
Tudo é
dito e ouvido num filme apenas. Tudo é visto com uma alegria colorida e uma
despreocupação de quem tem uma tarde sem nada para fazer e vai ver uma bela “coboiada”.
Só que
esta coboiada é mesmo muito a sério e nos deixa para sempre na memória uma
dança entre a Uma Thurman e o John Travolta e um modo novíssimo de olhar o
velho e maravilhoso cinema americano!
jef,
outubro 2019
«Pulp
Fiction» de Quentin Tarantino. Com John Travolta, Samuel L. Jackson, Uma
Thurman, Harvey Keitel, Tim Roth, Amanda Plummer, Maria de Medeiros, Ving
Rhames, Eric Stoltz, Rosanna Arquette, Christopher Walken, Bruce Willis. Argumento:
Quentin Tarantino e Roger Avary; Fotografia: Andrzej Sekula. Montagem: Sally
Menke. Produção: Miramax, A Band Apart, Jersey Films. EUA, 1994, Cores, 154
min.
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