Este livro é tão importante como os maiores compêndios
académicos e militares sobre a guerra colonial portuguesa. Porque é um livro
simples sobre um tema complicadíssimo, um mundo cada vez mais difícil e
complexo de explicar aos dias que, distantes e céleres, vão hoje correndo. A guerra
colonial formou (e talvez tenha deformado) uma espécie de lusa nação constituída
por militares que foram obrigados a cumprir ordens e que também tentaram organizar
uma sociedade um pouco mais justa dentro da injustiça de um conflito insolúvel.
João Carlos Roque conta-nos a sua ventura, as suas aventuras,
de modo directo, sem subterfúgios, adjectivos ou metáforas, através de curtos episódios como pequenas crónicas ou contos imediatos e realistas. Quatro anos lhe
foram apartados, saído à força de Económicas, obrigando-o a seguir de Mafra para
a Guiné, e desta de volta a Mafra, e depois até à Beira moçambicana. Daí, o
capitão miliciano em substituição de posto singular, foi levado até à longínqua
Ilha de Metarica nas margens do rio Lugenda, província do Niassa, Noroeste de
Moçambique. Mais tarde, levado também até às margens do 25 de Abril de 1974,
regressando apenas a Portugal em Dezembro desse ano.
E a guerra, e a organização militar em combate, e o convívio
entre pares pelo comando e pela sobrevivência, transformaram-no como homem.
Forçando-o, ou incentivando-o, a afirmar-se como cidadão pleno,
substanciando-se posteriormente no seu corpo, na sua ética, na sua acção.
Aqui, ficamos a conhecer, de modo tão pragmático quanto
comovente, o modo como uma guerra infame pode deixar, apesar de tudo, esse lastro
eterno e indelével, esse peso trágico e mesmo assim nostálgico, naqueles que a
viveram, que a sentiram.
jef, outubro 2020
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