segunda-feira, 12 de outubro de 2020

Sobre o livro «Ilha de Metarica, memórias da guerra colonial» de João Carlos Roque, INDEX ebooks, 2014


 









Este livro é tão importante como os maiores compêndios académicos e militares sobre a guerra colonial portuguesa. Porque é um livro simples sobre um tema complicadíssimo, um mundo cada vez mais difícil e complexo de explicar aos dias que, distantes e céleres, vão hoje correndo. A guerra colonial formou (e talvez tenha deformado) uma espécie de lusa nação constituída por militares que foram obrigados a cumprir ordens e que também tentaram organizar uma sociedade um pouco mais justa dentro da injustiça de um conflito insolúvel.

João Carlos Roque conta-nos a sua ventura, as suas aventuras, de modo directo, sem subterfúgios, adjectivos ou metáforas, através de curtos episódios como pequenas crónicas ou contos imediatos e realistas. Quatro anos lhe foram apartados, saído à força de Económicas, obrigando-o a seguir de Mafra para a Guiné, e desta de volta a Mafra, e depois até à Beira moçambicana. Daí, o capitão miliciano em substituição de posto singular, foi levado até à longínqua Ilha de Metarica nas margens do rio Lugenda, província do Niassa, Noroeste de Moçambique. Mais tarde, levado também até às margens do 25 de Abril de 1974, regressando apenas a Portugal em Dezembro desse ano.

E a guerra, e a organização militar em combate, e o convívio entre pares pelo comando e pela sobrevivência, transformaram-no como homem. Forçando-o, ou incentivando-o, a afirmar-se como cidadão pleno, substanciando-se posteriormente no seu corpo, na sua ética, na sua acção.

Aqui, ficamos a conhecer, de modo tão pragmático quanto comovente, o modo como uma guerra infame pode deixar, apesar de tudo, esse lastro eterno e indelével, esse peso trágico e mesmo assim nostálgico, naqueles que a viveram, que a sentiram.


jef, outubro 2020

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