Não queiramos que esta novela nos faça lembrar os belíssimos
livros «Porquê Olhar os Animais?» de John Berger (Antígona, 2020) ou «Alguns
Humanos» de Gustavo Pacheco (Tinta da China, 2018). Nem sequer essa antológica aula
prática de antropologia satírica de Alberto Pimenta (1977).
David Garnett (1892-1981) fazia parte desse grupo de artistas
inclassificáveis apelidado “Bloomsbury”, de onde se destacava Virginia
Woolf, e de que se dizia: «They lived in squares, painted in circles and loved
in triangles».
Na realidade, este livro é uma espécie de comédia, uma história
de amor com happy end mas com um unhappy beginning. John Cromartie e Josephine
Lackett estão noivos e são particularmente orgulhosos e determinados nas suas
proposições matrimoniais. John não admite ceder perante a família de Josephine,
e esta não compreende a apressada fúria do seu noivo. Andam a passear entre as
jaulas da secção dos canídeos do Jardim Zoológico de Londres e desentendem-se irremediavelmente. Logo nas primeiras páginas. Às segundas, por teimosia e despudor, numa espécie
de birra infantil, ele escreve à sociedade directora da instituição zoológica
que logo aceita a viva oferta para a exibição de um espécimen de Homo sapiens de tão destinto recorte. Retiram
o gibão, e John instala-se definitivamente entre o orangotango e o chimpanzé. O
caso torna-se um sucesso, as entradas no jardim multiplicam-se, e dar-se-ia por
findo se John e Josephine não continuassem tão apaixonados…
Pode não ser obra-prima, pode até conter traços de certa sobranceria intelectual, mas pensar em Londres, assim descrita, assim publicada, em 1924, dá que pensar. Uma bela tarde de leitura em torno da liberdade literária!
jef, outubro 2020
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