domingo, 11 de outubro de 2020

Sobre o filme «Verão de 85» de François Ozon, 2020

 






Após o naufrágio do barco de Alexis (Félix Lefebvre), salvo por David (Benjamin Voisin), ao largo de uma daquelas estranhas praias da Normandia, inicia-se um romance de Verão entre os dois rapazes. As cores são saturadas, entre o cor-de-laranja e o azul, a borrasca firma-se numa sombria e pintada trovoada. A distância entre as casas dos dois não existe, pois David, órfão endinheirado e mais atrevido, possui uma motoreta com a qual ameaça as curvas das estradas do litoral. Segundo ele, a vida é breve e não pode ser adiada. Alexis encanta-se ao primeiro olhar, e tem uma fixação adolescente e académica pela imagem fúnebre da morte. David leva Alexis a sua casa para mudar de roupa, onde o espectador conhece a extravagante e amorosa mãe de David, num papel fenomenal de Valeria Bruni Tedeschi. A mãe do náufrago é uma dona de casa extremosa (Isabelle Nanty) casada com um complacente estivador (Laurent Fernandez).

Até ali, entre o confronto provocador de uma paixão descoberta (e encoberta) numa pacata povoação marítima em época alta, tudo corria bem para o espectador. A partir do momento em que a estudante inglesa Kate (Philippine Velge) surge na praia e aceita viajar no barco de David é que o realizador François Ozon perde o curso da narrativa. As imagens, cenas e acontecimentos parecem tropeçar sem dar tempo aos personagens de entrarem no ecrã para transformar aquela quase comédia nessa quase tragédia, na qual Alexis, ajudado por Kate, surge na morgue travestido e ciclista.

Já vimos bem melhor de François Ozon em argumentos mais trabalhados, mas vale muito a pena olharmos de novo a capacidade dramática de duas grandes actrizes: Valeria Bruni Tedeschi e Isabelle Nanty. 

(ou andarei deslumbrado e cego pelas obras-primas de Akira Kurosawa?...)


jef, outubro 2020

«Verão de 85» (Été 85) de François Ozon. Com Félix Lefebvre, Benjamin Voisin, Philippine Velge, Melvil Poupaud, Valeria Bruni Tedeschi, Isabelle Nanty, Laurent Fernandez. Argumento: François Ozon, a partir do romance de Aidan Chambers «Dance on My Grave». Fotografia: Hichame Alaouie. Música: JB Dunckel. Guarda-roupa: Pascaline Chavanne. Produtores: Eric & Nicolas Altmayer. França / Bélgica, 2020, Cores, 100 min

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