Decorridos vinte e nove anos, «Requiem» continua limpo,
vigoroso, desavergonhado, acima de tudo, libertário. Aliás, a liberdade é
talvez o símbolo, a essência, que subtrai o livro a qualquer data cultural. A
liberdade linguística aqui assumida faz Tabucchi entrar no limbo universal dos
escritores apátridas. A realidade “alucinada” apresenta-se firme, calma,
racional, entregue de alma e corpo ao sonho e aos mortos. A vida morre e
renasce numa contínua alegria pagã, concretizada em doze horas sufocantes e
lisboetas, fazendo o espaço e o tempo coincidir e confundir-se logicamente. A
topografia onírica da capital adquire um brilho difícil de encontrar no tórrido
mês de Julho, através de uma narrativa que abraça a mais velha trama literária
– a viagem delirante. Deste modo, com gosto reafirmamos, uma vez mais, que o
autor de «Jogo do Reverso» é um dos mais lúcidos escritores contemporâneos da
língua portuguesa. E se os livros são de quem os lê, o presente requiem ficará
para sempre associado a José Cardoso Pires e aos pinheiros mansos que antes
verdejavam em torno do Camões. O livro termina com a tradução de Pedro Tamen
para o revelador texto “Um universo numa sílaba – vagabundagem à volta de um romance”
(1999).
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