domingo, 5 de abril de 2020

Sobre o filme «Boneca de Luxo» de Blake Edwards, 1961




















Este é um desses “filmes-estudo”. Tal como «Casablanca» (Michael Curtiz, 1942), é um filme venerado pelo público e a que os críticos torcem bastante o nariz, talvez por essa mesma razão. É raro o público e os críticos conseguirem acertar o passo na mesma valsa. «Boneca de Luxo» também tem um par de actores de sonho, uma história comovente, uma canção inesquecível, e é estreado numa situação sócio-política de batalha campal a exigir do público evasão cinematográfica simples e compreensiva.

E, porventura, tal desprezo dos críticos transporta alguma injustiça. Se todo o filme é deslumbrado pela diva absoluta Audrey Hepburn (Holly Golightly), pelos olhos azuis de George Peppard (Paul Varjak) ou pelo compreensivo “gato sem nome” Cat (Orangey), nessa fuga conjunta para a “rica, fácil e luminosa” Nova Iorque da rapariga vinda de um meio paupérrimo e inóspito e do escritor desamparado que tem no currículo apenas o livro «Nine Lifes / Sete Vidas», existe o princípio crítico social, envolto numa terna amabilidade que Truman Capote não conseguiu, nem desejou, colocar no seu livro. No início, a figura de princesa de Holly Golightly olhando com devota solidão a montra da Tiffany’s, enquanto come um pequeno-almoço take-away do Starbucks, diz tudo. A vida não é fácil e há que vencer a intempérie com determinação, mesmo deitando mão a intrincados estratagemas, ao melhor guarda-roupa («How do I look?»), a menos recomendáveis namorados ou decoradoras ricas e sonsas (Patricia Neal), mesmo que digam: « I’m a very stylish girl!». 

Não haverá aqui algumas parecenças com o aplaudido «O Apartamento » (Billy Wilder, 1960)?

E essa maravilhosa troca cénica de andares num velho prédio nova-iorquino subalugado, escada a cima escada a baixo, não tem qualquer coisa de maravilhoso, tal como em «O Pecado Mora ao Lado» (Billy Wilder,1955)?

E «Moon River» de Johnny Mercer e Henry Mancini, não é uma comovente e eterna canção-ícone?

E os objectos, os decores, o guarda-roupa e o movimento dentro dos cenários, não fazem lembrar um pouco os palcos de Jacques Tati?

Acima de todas as críticas e interpretações, no centro de um filme, que revejo sempre que posso e a quarentena obriga, está uma das actrizes mais belas e amoráveis de sempre: Audrey Hepburn!

jef, abril 2020

«Boneca de Luxo» (Breakfast  at Tiffany’s) de Blake Edwards. Com Audrey Hepburn, George Peppard, Patricia Neal, Mickey Rooney, Buddy Ebsen, Martin Balsam, José Luis de Vilallonga, John McGiver, Dorothy Whitney, Stanley Adams, Elvia Allman, Alan Reed, Beverly Powers, Claude Stroud, Orangey (o gato). Argumento: George Axelrod baseado na novela de Truman Capote. Música : Henry Mancini. Canção: «Moon River» Jonnhy Mercer/ Henry Mancini . Fotografia: Franz Planer. Guarda-roupa de Audrey Hepburn: Hubert de Givenchy. Direcção artística: Roland Anderson & Hal Pereira; Decores: Sam Comer & Ray Moyer. EUA, 1961, Cores, 110 min.


Sem comentários:

Enviar um comentário