O Paulo olha o mínimo das coisas
O Paulo é um rapaz que olha para o interstício das casas, para
os pespontos das coisas. Esses lugares como bainhas onde tanto se acumulam o pó
e o cotão como as migalhas do que está para chegar. Também a história de quem
as coseu e, agora, de quem as olha. É assim que ele se reconhece sem precisar
de passar pelo espelho.
Por outras palavras, o Paulo gosta de percorrer a cave ou o
sótão à procura, investigando, do alicerce ou da estrutura de uma memória. A
viga ou o pilar de uma ideia. Habituou-se a recordar e a recortar as
fotografias dessa ideia, colando-lhe depois os pedaços de um modo diverso, ou de um modo
difuso. É assim que melhor entende o osso de um olhar, a estética de um sorriso
que ainda se irá expressar. Alinhava o presente, ou melhor, cose a bainha do presente
como o faria a um jogo de Lego de que perdeu as instruções para montar.
Sabe que o futuro é construído por tentativas e ajustes.
O Paulo sabe que, tal como a beleza, o dia que chegará está,
precisamente, nas mãos da liberdade de o reconstruir, de olhar de novo para o
alinhavo da bainha, para a poeira revelada pela luz que acabou de entrar pelo
postigo.
jef, 25 abril 2020
* Perífrases e quarentena
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:)
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