sábado, 23 de maio de 2020

A Teresa tem queda para os doces









A Teresa tem queda para os doces

A Teresa tem muita queda para as compotas. Reflicto melhor, a Teresa é uma rapariga que gosta de ir até ao fogão e, com cuidado, ver o ponto de açúcar dos seus doces. Conhece muito bem a curiosa ligação que existe entre a fruta e o açúcar, ligação natural, de cheiros coloridos, que tanto atrai os insectos e os pássaros, ladrões que antes já polinizaram o que agora tomam como seu.

Sabe que são fundamentais as voltas da colher de pau sobre a massa informe, escaldante, borbulhosa, não vá pegar e desfazer esse outro instante futuro em que ela pensa “Está pronto!” e apaga o lume. Um instante único e tão precioso como o instinto de reconhecer a exactidão do ponto açucarado sobre os marmelos, os alperces, os pêssegos, os morangos, as amoras. Um instinto, uma espécie de amor, melhor dizendo, uma ternura que faz com que insectos e pássaros saibam sem saber que já principiou a época frutuosa do açúcar.

Teresa sente o mesmo instinto que inicia a época dos dias longos e ensolarados e que, mal arrefeçam os frascos, devidamente etiquetados com o nome da fruta e o ano correspondentes, a faz pensar nessa dádiva ternurenta que os outros confiarão depois a uma torrada em luminosa manhã de Verão.

jef, maio 2020

* perífrases e quarentena

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