Se existe um filme que melhor representa, simultaneamente, o universo
onírico das marionetas sentimentais de Tim Burton; a importância da fantasia
como máscara da humanidade; e ainda a real contradição que dá pelo nome de
“Estados Unidos da América”, ele é «Eduardo Mãos de Tesoura».
Tudo está aqui condensado num mundo habitado por quatro seres representados, em estado de graça, por Jonnhy Depp (Edward Scissorhands), Winona
Ryder (Kim), Dianne Wiest (Peg) e Anthony Michael Hall (Jim), um mundo perfeito
e desinfectado, colorido e intocado, sonorizado pela música de Danny Elfman e envolvido simetricamente por um bairro de onde partem e chegam automóveis a horas certas, e cheio de donas de casa inoperantes, fúteis e coscuvilheiras. Todos os que rodeiam a
família adoptiva de Eduardo Mãos de Tesoura são crédulos, ingénuos e
preconceituosos. Mereciam ter como presidente um imaginário homem perigoso e
estúpido, cabelo postiço amarelo de ‘roberto’, gravata vermelha até aos pés,
mãos agitadas de acordeonista cego. The Muppet Show.
Tudo isto consegue Tim Burton numa história que une, com
laivos de genialidade, a cinematografia de Walt Disney, Jacques Tati, Frank
Capra, Elia Kazan, Douglas Sirk ou Billy Wilder. A grande diegese ficcional
está aqui relatada: simples, dramática, triunfal. Tão infantil e fácil de
escutar como as histórias, emocionalmente angustiadas, que são ouvidas, nocturnas, desde a época clássica.
«Eduardo Mãos de Tesoura» contém em dicionário de A a Z, a
síntese plástica, afectiva, musical e narrativa, de um dos mais
inclassificáveis realizadores de sempre.
jef, abril 2020
«Eduardo Mãos de Tesoura» (Edward Scissorhands) de Tim
Burton. Com Jonnhy Depp, Winona Ryder, Dianne Wiest, Anthony Michael
Hall, Kathy Baber, Vincent Price, Robert Oliveri, Conchata Ferrell, Caroline
Aaron, Dick Anthony Williams, O-Lan Jones, Alan Arkin, Susan Blommaert, Linda
Perri, John Davidson. Música:
Danny Elfman. Argumento: Caroline Thompson segundo história de Tim Burton e
Caroline Thompson. Fotografia: Stefan Czapsky. Som:
Petur Hliddal. EUA, 1990, Cores, 103 min.
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